VINHO MEXICANO SI SEÑOR
Perto da fronteira com os EUA, o Vale de Guadalupe esconde a ‘ruta del vino’, com uvas ecléticas e boa comida na terra da ‘cerveza’ e tequila
preços acessíveis. Os melhores deles eram claramente produtos de classe internacional. Todos vinham de um lugar chamado Vale de Guadalupe, no Estado mexicano de Baja Califórnia.
Já havia encontrado outros santuários inexplorados do vinho em viagens à Croácia, à Hungria, a Israel, à Eslovênia e à Turquia. Mas será que o México, terra da “cerveza” e da tequila, superaria todos?
Sempre de carro, percorri por diversos dias a “ruta del vino” do Vale de Guadalupe. Era uma região vinícola distinta de todas que visitei.
A primeira diferença é que, em uma região tão árida, da estrada só vê algumas vinhas esparsas. Hoje em dia, uvas são cultivadas em todo lugar, mas a maneira pela qual elas chegaram ao vale é uma história peculiar. Uma obscura seita de cristãos agrários russos conhecidos como molokans migrou para o México por volta de 1905 e decidiu testar seu talento agrícola no deserto. Os molokans não bebiam álcool, mas vendiam uvas àqueles que o faziam.
Em 1988, um cientista de ascendência alemã chamado Hans Beckoff Senior fundou a Monte Xanic e com isso se tornou o primeiro produtor de vinhos de qualidade no vale. Outros seguiram seu exemplo, e os enólogos que contratam na França, na Itália e na Espanha trouxeram com eles as variedades naturais de uvas de seus países.
Seria fácil imaginar que o vinho resultante é uma bagunça multicultural sem ne- nhum mérito. Mas quando você começa a beber, para de reclamar. Como me disse um dos vinicultores mais conhecidos da região, José Luis Durand, “o ecletismo é parte do caráter de nosso vinho”.
Jantei com o chileno Durand, na modesta cidade costeira de Ensenada, a meia hora do vale, em um restaurante italiano chamado Da Toni. Meu companheiro produz vinhos com muita personalidade, usando uvas raras como a nebbiolo e a tannat.
Ainda em Ensenada, na churrascaria Sano’s, acompanhei meu filé mignon com uma sedosa mistura de tempranillo e syrah da Norte 32, vinícola do aposentado Oscar Obregón, que sorriu modestamente com meus elogios.
Até em uma ensolarada barraca de frutos do mar chamada Muelle 3 tomei um aguçado sauvignon blanc produzido por Wenceslao Martinez Santos, da Relieve Winery: pronto, perfeição garantida. PAULO MIGLIACCI