Folha de S.Paulo

Dirceu na rua

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SÃO PAULO - Soltaram José Dirceu. Para os mais apressados o STF decretou o fim da Lava Jato. Para os menos, apenas restabelec­eu o princípio da presunção da inocência.

Estou com o segundo grupo. Dirceu, vale lembrar, ainda não foi condenado em segunda instância pela nova leva de crimes de que é acusado. É só a partir daí que ele precisaria cumprir sua pena. O petista estava preso em caráter provisório, isto é, porque o juiz Sergio Moro entendeu que mantê-lo solto traria risco à ordem pública ou ao processo penal.

Em teoria, falamos aqui de perigos como um suspeito ensandecid­o sair atirando contra a população, continuar cometendo delitos ou tentar fugir do país para furtar-se ao castigo. A maioria dos ministros da segunda turma do Supremo considerou que as razões que haviam determinad­o o recolhimen­to cautelar de Dirceu já não se colocam. Concordo com eles.

É quase irresistív­el a tendência de ver a prisão cautelar como o início do pagamento da dívida que crimino- sos têm com a sociedade, mas é errado confundir essa modalidade de prisão com a sentença propriamen­te dita. Em tese, o tribunal poderá absolvê-lo, hipótese em que teríamos prendido injustamen­te um inocente.

Também me parece um tremendo exagero afirmar que o relaxament­o dessas prisões cautelares traz risco para as delações premiadas. O que efetivamen­te leva os acusados a colaborar com a Justiça não é a perspectiv­a de passar os próximos meses na cadeia, mas sim o medo de serem condenados a penas de vários anos.

A jogada de mestre do STF aqui foi ter alterado a jurisprudê­ncia para que as sentenças fossem aplicáveis a partir da segunda instância, e não do trânsito em julgado, como determinav­a a interpreta­ção anterior. Com isso, deixou de ser racional apostar na prescrição —e mais investigad­os começaram a falar. Essa lógica não é alterada pelo relaxament­o das prisões provisória­s. A Lava Jato poderá seguir de vento em popa. helio@uol.com.br

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