Pregão para monitorar desmate é suspenso
Para cientistas, edital de R$ 78,5 milhões lançado pelo governo repetiria ações do Inpe
Foi suspenso nesta quinta (4), no mesmo dia em que era para ter sido encerrado, um edital do Ministério do Meio Ambiente (MMA) para contratação de serviços de monitoramento de desmatamento.
Antes do anúncio de adiamento, a possibilidade de contratação foi alvo de críticas do Ministério Público Federal e uma investigação foi iniciada.
O edital, no valor de R$ 78,5 milhões e publicado no último dia 20, tinha como objetivo a “contratação de serviços especializados de Suporte à Infraestrutura de Geoprocessamento e Atividades de Sensoriamento Remoto para atendimento às demandas de monitoramento ambiental e geoprocessamento”.
Atualmente, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) é a instituição governamental responsável pelos dados referentes ao desmatamento na Amazônia. Uma das principais armas para controle e monitoramento do desmatamento é o Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), que é complementado por outros sistemas, como o Deter, também do Inpe.
O MMA afirma que o objetivo do pregão é melhorar a análise de dados referentes ao desmatamento e elevar a eficiência da gestão ambiental.
Mas, segundo pesquisadores ouvidos pela Folha, o edital lançado pelo MMA provocaria uma redundância nas ações de monitoramento já realizadas pelo Inpe.
“Eu estimo que 41% do edital seria uma sobreposição”, afirma Raoni Rajão, coordenador do laboratório de gestão de serviços ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais. “Você não pode comprometer 20% do orçamento anual do MMA sem pensar para o que vai servir aquilo e se é mesmo necessário.”
Gilberto Câmara, ex-diretor do Inpe, afirma que os dados fornecidos pelo instituto são referência internacional e que não faz sentido questionar a qualidade deles. “É um edital que não se sustenta tecnicamente, ele prejudica o interesse público”, diz.
Ele afirma que a evolução no combate ao desmatamento foi baseada em dados fornecidos pelo Inpe, que faz o monitoramento há cerca de 30 anos. “Por que agora, que o desmatamento está voltando a crescer, o MMA está desconfiando? Não estão gostando do termômetro”, diz.
Os cientistas afirmam que, no momento, o melhor investimento para evolução no combate ao desmate seria em ação de campo, não em dados.
Houve reação também por parte do Ministério Público Federal. “A tarefa de monitorar o desmatamento da Amazônia é regulamentada por decreto governamental e prevê a coordenação do Inpe, com a participação do Centro Regional da Amazônia [...] As informações geradas pelo Inpe são cruciais para os acordos internacionais firmados [...] para controle das emissões de carbono, por exemplo”, afirma o MPF em seu site.
O Ministério do Meio Ambiente diz que é “falsa a informação de que [...] teria a intenção de substituir o monitoramento do desmatamento, que vem sendo realizado com excelência técnica e científica pelo Inpe[...]”. (PHILLIPPE WATANABE)