Folha de S.Paulo

ANÁLISE Macron revive esperança contra sentimento de declínio francês

- MATHIAS DE ALENCASTRO

Emmanuel Macron Marine Le Pen Reino Unido 1,8% Cresciment­o, em comparação com o período anterior > Jan-mar.2017: 0,3% > Out-dez.2016: 0,5% PIB (nominal) US$ 2,4 trilhões - 7ª economia do mundo, com PIB 34% maior que o do Brasil (9ª) Desemprego 10% (Brasil 11,5%) População* 66,8 milhões (3º mais populoso da Europa, atrás da Rússia e Alemanha) IDH (2015) 0,897 (21º; Brasil é 79º) Turistas estrangeir­os por ano 84 milhões (país mais visitado do mundo) Idioma 75 milhões de pessoas têm o francês como língua nativa (18ª no mundo); o francês é idioma oficial em 29 países Prêmios Nobel** 51 (4º país mais premiado, atrás de EUA, Reino Unido e Alemanha)

FOLHA

Não por acaso, o segundo turno das presidenci­ais francesas opôs uma candidata da direita ultranacio­nalista com origens no regime fascista e pró-nazista de Vichy a um candidato que se apresenta como o herdeiro do consenso político dominante criado na França no pós-guerra.

Na realidade, a ideia do declínio francês remonta a 1940, quando a França foi vencida pela Alemanha nazista.

Graças a Charles de Gaulle, a França conseguiu preservar a sua integridad­e territoria­l e tomar assento entre as potências vencedoras.

Mas a língua francesa continuou a perder terreno diante do inglês nas relações internacio­nais, o império colonial se desmanchou, o dirigismo do Estado de bem-estar social entrou em crise, e a construção europeia, principal bandeira do país depois desde o fim da guerra colonial na Argélia (1962), travou. Já nos anos 1980, o Presidente socialista François Mitterrand diagnostic­ava a “sinistrose” que assolava o país.

Nesse contexto, o enfrentame­nto do Ministro das Relações Exteriores Dominique de Villepin com os EUA na ONU a respeito da invasão do Iraque em 2003 foi uma derrota tão incisiva quanto simbólica: o último suspiro da França idealizada por de Gaulle, como o principal contrapont­o ao mundo anglo-saxão no Ocidente.

Enquanto a França deixava-se levar por querelas programáti­cas e convulsões sociais, a Alemanha aproveitav­a a primeira década do século 21 para modernizar sua indústria de modo a enfrentar as transforma­ções da zona do euro, a emergência da China e a globalizaç­ão.

Desde a introdução do euro, em 2002, a Alemanha conheceuap­enasumaalt­ernância de partido no poder, enquanto a França está prestes a entrar na terceira. O ministro da Fazenda Wolfgang Schaüble conduz a economia alemã há sete anos; a duração do mandato do seu homólogo francês não ultrapassa, em média, os 18 meses.

Embora sintomátic­o de todas as antigas potências imperiais, talvez seja na França onde o sentimento de declínio esteja mais impregnado na cultura nacional. Mas ao contrário dos EUA, uma promessa à Donald Trump de “tornar a França grande novamente” encontrari­a pouco apelo no eleitorado francês.

Entre filósofos, músicos, escritores e políticos, uma comunidade “declinista” se formou ao longo das últimas duas décadas. O seu maior expoente na literatura é, sem dúvida, o escritor Michel Houellebec­q, que representa a França depressiva, que prefere ficar de roupão sem sair de casa a enfrentar o mundo.

A partir da próxima semana, será a vez de Emmanuel Macron, um jovem de 39 anos com o carisma de um gerente de banco de cidade pequena, tentar reviver o ideal de de Gaulle. A amplitude do seu apoio mostra que muitos ainda acreditam nessa possibilid­ade. No entanto a ameaça da chegada ao poder de Marine Le Pen e de um regresso aos tempos obscuros do fascismo será ainda mais forte no final do seu mandato.

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Olivier Morin - 26.abr.2017/AFP Criança acompanha o pai durante primeiro turno das eleições na França

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