Projeto une refugiados e empregadores usando ‘máquina de currículos’
Ação itinerante quer ajudar estrangeiros a encontrar trabalho no Brasil; hoje há quase 9.000 pessoas nessa situação no país
“Você acredita em destino?”, diz a grande placa branca.Logoabaixo,umbotãoverde. Quem o aperta participa de uma espécie de sorteio, só que desta vez o prêmio é um pouco mais complexo: achar emprego para um refugiado.
A “máquina” é uma ação do projeto Estou Refugiado em parceria com a ONG Human Rights Watch. Ficará instalada até este domingo (7) no MIS (Museu da Imagem e do Som), no Jardim Europa, zona oeste de São Paulo.
Funciona assim: o computador embaralha os nomes de 38 estrangeiros e escolhe um deles, que aparece na tela. Essa pessoa então conta sua história num vídeo, enquanto seu currículo é impresso. É aí que entra a parte do destino.
O participante é convidado a indicar ou oferecer um trabalho para aquele que “o acaso” lhe apontou. A síria Alaa Mansour, 24, foi a primeira a receber uma proposta, para ser secretária bilíngue —além do árabe, ela fala inglês.
A jovem chegou da capital Damasco há dois meses com o marido, fugida da guerra que já deixou 400 mil mortos em seu país. Quer continuar os estudos em economia e achar um trabalho.
O congolês Jeef Bobolibanda, 45, veio há dois anos, por outro motivo. Após sua irmã ser assassinada durante uma manifestação, ele passou a trabalhar numa ONG para denunciar violências contra os direitos humanos.
Começou a ser perseguido e chegou a ser torturado durante uma semana. Enquanto se recuperava dos ferimentos, um militar o deixou fugir do hospital. Foi quando ele resolveu sair do país.
Lá, era professor e complementava a renda como agente de segurança e operador. “Combinava muitos serviços, porque o pagamento é pouco.” Aqui, já trabalhou como ajudante geral em indústrias e num restaurante francês.
“Nomomentonãotenhoescolha, todo trabalho vou fazer,porquetenhoquemandar dinheiro para a minha família.” Ele já conseguiu alugar uma casa em Santana (zona norte) e tenta trazer a esposa e seus cinco filhos do Congo.
Desde segunda (1º), Jeef está fazendo um “bico”, como ele mesmo diz, no museu. Ele apresenta a “máquina de currículos” aos visitantes.
A ação acompanha a exposição “Farida, um conto sírio”, do fotógrafo Mauricio Lima, que mostra a saga de milhões de refugiados por meio da jornada de uma família. Diferentemente da exposição, porém, a máquina só vai ficar ali por uma semana.
O plano é que ela seja itinerante, conta Luciana Capobianco, publicitária e diretoraexecutivadoEstouRefugiado. “A partir da semana que vem continuamos. A ideia é coletar mais 50 histórias agora.”
Segundo ela, o objetivo é “rodar” em locais mais próximos do empresariado, como o Conjunto Nacional e o shopping Iguatemi. O Estou Refugiado trabalha há quase dois anos com a conscientização sobre os refugiados e a recolocação deles no mercado. Os projetos são financiados pela própria Luciana.
“A proposta desta ação é fazer uma provocação aos empresários. Existem muitos refugiados qualificados, que tiveram que largar o que faziam. Não é só a questão da vaga, é preciso ajudá-los a se inserir nas empresas”, diz ela.
Os últimos dados do Ministério da Justiça apontam que havia 8.863 refugiados no Brasil em abril de 2016 —um aumento de 127% com relação a 2010. Os sírios, como Alaa, têm a maior comunidade (2.298), seguidos pelos angolanos (1.420). Ao todo há 79 nacionalidades.