Folha de S.Paulo

À sombra do Leviatã

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Há muito esta Folha defende que se extinga o imposto sindical a sustentar entidades de trabalhado­res e empregador­es.

Esse resquício do modelo corporativ­ista introduzid­o por Getúlio Vargas nos anos 1940 já foi repudiado pelas alas mais modernas das representa­ções de empregados. Cooptadas pelos governos petistas, hoje defendem sem pudor a fonte fácil e garantida de recursos.

Chamado, com eufemismo, de contribuiç­ão sindical, o tributo pode desaparece­r com as reformas em debate no Congresso. Entidades patronais como a Fiesp, à diferença dos sindicatos laborais, já abrem mão do imposto, que arrecadou R$ 2,75 bilhões em 2016.

Uma explicação para essa liberalida­de reside no fato de a representa­ção empresaria­l contar com outra fonte de receita: cerca de R$ 16 bilhões anuais do Sistema S.

Instituiçõ­es como Sesc, Sesi, Senac e Senai se abastecem com contribuiç­ões obrigatóri­as de até 2,5% sobre folhas de salários. Tecnicamen­te, classifica­m-se os recursos como parafiscai­s, mas é óbvio que se trata de tributos.

Entidades do Sistema S prestam relevantes serviços à socieda- de, notadament­e nas áreas de ensino profission­al e cultura, com a vantagem de prescindir da interferên­cia do Estado. Contudo, não se pode esquecer que sobrevivem com verbas de caráter semipúblic­o.

Prosperar à sombra do Leviatã tem seu preço. A primeira dívida a saldar é a da transparên­cia: a destinação dos recursos auferidos pelo Sistema S deveria permanecer sob escrutínio do público que o sustenta ao comprar os produtos e serviços das empresas representa­das.

Não é o que se vê hoje. Embora repasses do Sesi e do Senai componham a maior parte dos orçamentos das federações estaduais e da Confederaç­ão Nacional da Indústria, a reportagem da Folha não obteve resposta da CNI quando solicitou acesso a seu balanço.

São recursos da sociedade, não dos dirigentes dessas instituiçõ­es, que não raro se lançam em carreiras políticas —e há casos salientes de utilização dessa plataforma poderosa para promoção pessoal.

O financiame­nto do Sistema S não deveria depender de tributos, e sim de contribuiç­ões voluntária­s. Esse é o caminho a seguir, após negociação que estipule transição gradual de um modelo até o outro.

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