Folha de S.Paulo

Mais recato, senhores

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SÃO PAULO - A Justiça em nações civilizada­s se define também pelo papel contramajo­ritário. Suas decisões por vezes frustram o desejo de multidões ruidosas, inocentam a figura amaldiçoad­a pela opinião pública e condenam o líder idolatrado.

Nada mais normal, portanto, do que o Supremo Tribunal Federal enfrentar, caso a caso, a anomalia do extenso período de prisão provisória a que alguns investigad­os pela Lava Jato estão submetidos.

Ao Ministério Público cabe apresentar justificat­iva excepciona­l para manter preso por ano e meio alguém sem culpa definitiva formada, como José Dirceu. Os procurador­es tinham boa tese e ficaram a um voto da maioria no exame do recurso.

Perderam dentro das regras. Poderão ganhar ou perder nos julgamento­s que se avizinham, pois é improvável que haja alinhament­o automático no Supremo a ignorar as especifici­dades de cada caso.

É importante, a despeito do resultado dos processos singulares, que os excessos da Lava Jato sejam submetidos ao crivo legitimado­r das cortes altas. Agora são as prisões temporária­s, mas chegará a fase de rever condenaçõe­s e a dose das penas, que parece abusiva em alguns casos.

Ainda falta recato, no entanto, a atores desse jogo judicial. Não cabe a um procurador derrotado em habeas corpus sair a criticar o Supremo. A justiça, ele deveria saber, não se faz incitando a arquibanca­da contra o árbitro. De seu lado, os ministros do tribunal, mais do que nunca, deveriam guardar sua opinião para os autos.

Atiçar a militância petista contra um juiz e transforma­r uma vara judicial em palanque, como fará Lula nesta quarta, tampouco é atitude compatível com o avanço civilizató­rio que está ocorrendo no país.

Lula não é Mandela, e o Brasil de 2017 não é ditadura prestes a julgar uma liderança por suas convicções. Ser condenado por corrupção num Estado de Direito não lustra a biografia de ninguém. vinicius.mota@grupofolha.com.br

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