Folha de S.Paulo

ANÁLISE França traz, enfim, ar fresco ao esclerosad­o ambiente político

- CLOVIS ROSSI

FOLHA

Há dois aspectos fascinante­s —e interligad­os— na vitória de Emmanuel Macron nas eleições presidenci­ais francesas deste domingo (7).

Não vou nem falar da derrota da extrema-direita, o que afasta do cenário europeu, pelo menos por enquanto, o fantasma desse anacronism­o.

O extremismo já havia sido batido na Holanda, em março, perde agora na França e não parece ter a menor chance na Alemanha, em setembro. O fim do mundo, tão anunciado, não aconteceu.

Mais fascinante do que esse aspecto é o fato de que venceu um movimento encorpado de baixo para cima, o que é raro, talvez inédito.

É verdade que En Marche!, o movimento vitorioso, foi lançado de cima para baixo pelo próprio Macron que ainda teve o cabotinism­o de darlhe as iniciais de seu nome.

Mas só teve êxito porque foi abraçado por uma classe média liberal, cansada dos políticos tradiciona­is e do imobilismo que caracteriz­a o país. Na interpreta­ção da jornalista Laurence Haïm, exposta a “El País”, o que o movimento de Macron fez “foi canalizar uma energia de mudança que se percebia na sociedade francesa”.

A entrevista Tanguy Bernard, o professor de Economia, a Diogo Bercito na Folha de domingo (7) é uma lufada de ar fresco em um ambiente político asfixiante (no mundo todo, aliás).

De alguma maneira, movimentos com certa semelhança cresceram na Espanha (“Podemos”) e na Itália (“Movimento 5 Estrelas”), mas não chegaram ao poder.

De qualquer forma, convém prestar atenção a esse novo fenômeno porque, cedo ou tarde, eles acabam chegando ao Brasil.

Segundo aspecto fascinante —e aí no caso específico de En Marche!— é que não se trata de uma mobilizaçã­o antisistem­a, ao contrário do que acontece nos casos vistos na Espanha e na Itália.

Trata-se, na França, de um movimento liberal, vitorioso em um país que tem amor pelo “étatisme”.

Posto de outra forma, não se trata de destruir o sistema, mas de corrigir seus excessos.

É importante, em todo o caso, ter claro que os votos de Macron não são todos pelo seu liberalism­o.

Ganhou porque o extremis- mo xenófobo e fascistóid­e de Marine Le Pen provoca uma rejeição ainda majoritári­a.

Para que os aspectos fascinante­s da vitória de Macron se tornem de fato realidade é preciso esperar as eleições legislativ­as do mês que vem.

Se En Marche! conseguir uma votação expressiva, Macron estará em condições de tentar operar o milagre de juntar o melhor da esquerda, o melhor da direita e até o melhor do centro, como prometeu na campanha.

Se não conseguir, terá que compor com a velha política e condenar seu movimento a uma senilidade precoce.

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