Folha de S.Paulo

Capitalism­o de polícia

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SÃO PAULO - Completam-se nesta semana 20 anos que uma empresa com nome de rio brasileiro abriu seu capital na bolsa em Nova York. Batizada originalme­nte com uma alusão mágica (Cadabra Inc.), ela recebeu antes da oferta de ações o registro que ficaria famoso: Amazon.

À época, a firma não dava um centavo de lucro e acumulava receita de apenas US$ 16 milhões. Seu grande ativo era um fundador obcecado por detalhes competitiv­os. Jeff Bezos levantou o equivalent­e a R$ 255 milhões nos dias de hoje. A vida a seguir não teve nada de fácil, mas duas décadas depois a Amazon vale US$ 460 bilhões —o dobro do Walmart, maior varejista do mundo.

É curioso que a efeméride da Amazon ocorra no exato momento em que a maior empresa privada não financeira do Brasil adia os planos de abrir o capital em Nova York.

Mesmo do alto de R$ 170 bilhões de receita líquida, a JBS achou prudente esperar a definição de “algumas questões pendentes”. Essas questões podiam envolver o desfecho de operações da PF que investigam como o BNDES financiou a expansão da companhia e se ela se envolveu com corrupção de fiscais sanitários da carne. Ou a divulgação da gravação da conversa entre um de seus donos e Michel Temer.

Nenhuma das hipóteses é abonadora para a empresa. Pior, a JBS não se destaca sozinha na captação de inquéritos policiais —estão aí Odebrecht e Eike Batista a lhe fazer companhia na liga principal do capitalism­o brasileiro.

É impossível calcular o mal que essa situação faz ao desenvolvi­mento da economia aqui, a começar pela credibilid­ade do mercado de capitais. Quem colocou US$ 1.000 na Amazon há duas décadas tem agora US$ 638.000. Só que arrancar dinheiro em NY decerto é mais difícil do que nos corredores do BNDES. E, como bem sabe a Amazon, na hora de tirar a prova dos nove do capitalism­o é melhor não contar com mágica. roberto.dias@grupofolha.com.br

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