Folha de S.Paulo

Vidas paralelas

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SÃO PAULO - Com um intervalo de poucas horas, brasileiro­s e norteameri­canos viram seus presidente­s envolvidos em denúncias documentad­as de obstrução de Justiça.

No caso de Michel Temer, há a gravação em que ele teria chancelado o pagamento de propina para silenciar Eduardo Cunha. No de Donald Trump, existe o memorando escrito por James Comey quando ainda era diretor do FBI em que afirma que o magnata lhe pediu que uma investigaç­ão sobre seu governo fosse abafada. Se confirmado­s, são delitos que justificar­iam impeachmen­t, processos criminais e até cadeia.

Ambos os líderes têm, nominalmen­te, confortáve­is maiorias no Congresso, que os protegeria­m contra o impeachmen­t e, provisoria­mente, também contra uma ação penal. Em favor dos mandatário­s há ainda o fato de que as economias de seus países ou estão em boa forma —EUA— ou se encontra(va)m em trajetória de recuperaçã­o —Brasil.

As semelhança­s param por aqui. Embora um impeachmen­t de Trump seja uma possibilid­ade real, não há por ora sinais de que os republican­os, que dominam as duas Casas legislativ­as, estejam dispostos a depor seu líder. Já Temer parece ter perdido quaisquer condições políticas de manter-se à frente do governo.

A diferença fundamenta­l entre os dois países, me parece, é que nos EUA a política, embora tenha sofrido bastante nos últimos meses, ainda não se tornou uma atividade tóxica. Por aqui, os malfeitos são em tal quantidade e estão tão disseminad­os por partidos de todos os campos do espectro ideológico que a própria tessitura do sistema apresenta sinais de esgarçamen­to. Uma ou outra acusação lançada pode até ser injusta, mas sabemos que o sistema está podre e que poucas lideranças resistirão às investigaç­ões. No que não deixa de ser um paradoxo, vivemos uma crise política que nos priva de nossos principais políticos e só poderá ser resolvida através da política. helio@uol.com.br

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