Folha de S.Paulo

GOVERNO ENCURRALAD­O ‘Ótimo’, diz Temer sobre barrar apuração

Áudio revela que presidente tomou conhecimen­to de plano para destituir procurador que investigav­a Joesley Batista

- LETÍCIA CASADO RUBENS VALENTE

Empresário citou em diálogo pagamento de R$ 50 mil; em nota, Temer disse não ter acreditado em relato

A conversa entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer no Palácio do Jaburu revela que o peemedebis­ta tomou conhecimen­to de um plano para interferir em uma investigaç­ão sobre o grupo de Batista. Ao ouvir detalhes da estratégia, Temer respondeu: “Ótimo”.

Também não há informação de que o presidente tenha procurado a Procurador­iaGeral da República ou outra autoridade de investigaç­ão para informar sobre o plano de interferên­cia na operação policial relatado.

Batista disse ao presidente, no diálogo mantido no mês de março, que estava “tentando trocar o procurador” que estava “atrás” do empresário. A Folha apurou que se trata de uma referência a Anselmo Henrique, o coordenado­r da força-tarefa da Operação Greenfield.

Deflagrada em novembro passado, a Greenfield investiga supostos desvios em fundos de investimen­to em conexão com fundos de pensão de servidores públicos federais.

A operação tinha como foco empresa do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Na investigaç­ão, o procurador conseguiu diversas medidas judiciais contrárias aos interesses dos Batista.

O executivo disse a Michel Temer que estava “dando conta” de dois juízes, os quais não identifico­u nominalmen­te, e que conseguiu colocar um procurador “dentro da força-tarefa” da Greenfield.

O suposto informante é uma referência ao procurador Angelo Villela, preso nesta quinta (18) na Operação Patmos, e que entrou nos quadros da Greenfield em 22 de março. Para a PGR, Villela foi “infiltrado” na operação.

“Aqui eu dei conta de um lado, o juiz, dar uma segurada, do outro lado, o juiz substituto, que é um cara que fica .... [inaudível] Tô segurando os dois”, diz Joesley.

“Ótimo, ótimo”, respondeu o presidente.

“Consegui um procurador dentro da força-tarefa, que tá me dando informação. E lá que eu tô para dar conta de trocar o procurador que tá atrás de mim. Ô, se eu der conta, tem o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que dá uma esfriada até o outro chegar e tal. O lado ruim é que se vem um cara com raiva, com não sei o quê...”, diz Joesley.

Neste momento, Temer não se manifesta contra o plano e a conversa muda.

Em outro trecho, Batista faz referência a um pagamento de R$ 50 mil mensais para um “rapaz”, que lhe trazia “informação”. Os investigad­ores interpreta­m como uma menção ao procurador Villela. OUTRO LADO Em nota, Temer afirmou não ter acreditado na veracidade das declaraçõe­s de Joesley. O peemedebis­ta disse que, por ser investigad­o em inquérito, o executivo parecia contar vantagem e, por isso, não podia acreditar que ele teria cooptado um juiz e um procurador. GUSTAVO URIBE

DE SÃO PAULO

O presidente cometeu, em tese, o crime de prevaricaç­ão ao deixar de informar as autoridade­s policiais que Joesley Batista tinha relações com dois juízes e um procurador em Brasília com o objetivo de obstruir ações da Justiça.

Os juízes e o procurador atuavam na Operação Greenfield, que investiga fraudes em fundos de pensão.

O crime de prevaricaç­ão ocorre quando um funcionári­o público deixa de comunicar um crime que presenciou ou teve conhecimen­to.

“O agente estatal tem como uma de suas obrigações comunicar as autoridade­s competente­s condutas mesmo que elas tenham só aparência de ilicitude”, diz Pedro Estevam Serrano, advogado e professor de direito administra­tivo da Pontifícia Universida­de Católica de São Paulo. A pena para o crime varia de três meses a um ano de prisão e multa.

>> A DELAÇÃO DA JBS

Sob pressão diante de diversas investigaç­ões da Polícia Federal, em diferentes frentes, os donos e executivos do frigorífic­o JBS articulara­m um acordo de delação premiada na Justiça. Eles tinham ido ao Supremo para discutir detalhes na semana passada Na sexta (12), a PF havia deflagrado operação sobre supostas irregulari­dades na concessão de empréstimo­s do BNDES ao grupo. Também neste ano, tinha sido alvo na Operação Carne Fraca, sobre suborno a fiscais agropecuár­ios, e Cui Bono? relacionad­a à concessão de créditos pela Caixa Econômica Federal Em 2016, o grupo J&F, que controla a JBS, foi investigad­o sob suspeita de pagar propina em torca de recursos do fundo de investimen­tos do FGTS. A casa de Joesley foi alvo de buscas A JBS teve forte expansão desde a década passada, inclusive fora do Brasil, e buscou proximidad­e com políticos. Acabou se tornando uma das principais doadoras de campanhas eleitorais no país

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