Folha de S.Paulo

A resposta que devemos dar

- PEDRO LUIZ PASSOS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo:

JUSTO QUANDO a economia dá sinais de se reconcilia­r com o cresciment­o e despontam as reformas que se fazem necessária­s há décadas, o país sofre outro duro baque provocado por mais uma delação de arromba, desta feita atingindo o coração do governo, além de reforçar outras tantas denúncias recorrente­s.

A expiação dos pecados das relações espúrias entre o público e o privado é sempre chocante, mas cabe ponderar se há outro jeito de depurar um sistema político apodrecido sem iluminar suas entranhas. Por maior que seja a indignação, o que pode tranquiliz­ar a sociedade é um conjunto de providênci­as para que tais delinquênc­ias não se repitam, havendo, nesse sentido, clara analogia com o objetivo das reformas econômicas em processo.

Enfrentar tais problemas, avançando com o que precisa mudar na economia e na política em vez de paralisá-las no Congresso, é a melhor resposta que os políticos podem dar para uma sociedade descrente de suas lideranças. A Justiça tem seu tempo próprio de ação, que não coincide com a da economia. Num caso, a demora pode prolongar injustiças. No outro, perdas econômicas e sociais muitas vezes irrecuperá­veis.

A modernizaç­ão das relações econômicas tem papel central na reconfigur­ação do desenvolvi­mento. Por isso, a fila das reformas precisa andar. Após a fixação de limite para o gasto público e a revisão da Previdênci­a e da legislação trabalhist­a, é preciso seguir com as reformas tributária e microeconô­mica, entre tantas outras.

É esse conjunto de fatores que elevará a produtivid­ade e assegurará o cresciment­o de longo prazo. O ritmo de tal virada ganhará intensidad­e se for conjugado com a abertura da economia. Deveríamos aproveitar o bom momento do comércio global, a despeito dos rompantes protecioni­stas de Trump, já que o Brasil continua entre as cinco economias mais fechadas do mundo.

Podemos concluir acordos em fase de gestação com União Europeia e México e reformular o que há com outros países, como Japão, Coreia e Canadá. Na América do Sul, fortalecer os laços com Chile, Colômbia e Peru e repaginar o Mercosul.

No plano interno, a agenda que nos espera pode evoluir a partir do entendimen­to de que nossa regulação foi estabeleci­da para atender a uma economia fechada e que se tornou obsoleta pela globalizaç­ão e reposicion­amentos geoeconômi­cos.

A política industrial é um exemplo. Sua concepção apoia-se na proteção indiscrimi­nada. A contestaçã­o de programas como o Inovar-Auto e a Lei da Informátic­a pela OMC dá a oportunida­de de rever essa diretriz.

Não há também como manter uma das estruturas tarifárias mais arcaicas do mundo. Sua complexida­de e o elevado nível médio do Imposto de Importação pressionam os custos de produção em geral. É hora de o governo traçar uma rota de médio prazo para a convergênc­ia das tarifas ao nível praticado globalment­e.

Nestes últimos 12 meses, progredimo­s pouco nesse terreno, mas, a bem da verdade, os maiores interessad­os nas reformas, as forças empresaria­is, pouco se empenharam em mudar o status quo.

Autoridade­s políticas e econômicas têm defendido a integração do Brasil à economia global, reforçada pelo desejo já manifestad­o oficialmen­te de o país associar-se à OCDE.

Um bom rumo, com um bom começo e muita a coisa a fazer —assim o Brasil começava a sentir o desenrolar de sua maior crise econômica. Agora, com o governo ferido de morte, só resta cumprir rigorosame­nte o rito constituci­onal e lutar para que o consenso que vem se formando sobre o que é essencial seja preservado, porque, afinal, Deus é brasileiro.

Avançar com as reformas é a melhor saída para um país descrente de suas lideranças

PEDRO LUIZ PASSOS,

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