Estudo traça impacto de migração científica
Imigração qualificada aumenta patentes, produtividade dos pesquisadores e desenvolvimento econômico do país
EUA, China e União Europeia são os países que mais atraem; Brasil é um dos que mais têm cientistas de volta
“Cientistas são animais migratórios”. Assim começa um estudo especial da revista científica americana “Science” sobre migrações.
Os dados coletados pelo pesquisador John Bohannon para a “Science” produziram resultados semelhantes aos que as Nações Unidas têm divulgado. Em 2015, um em cada cinco cientistas vivia em um país da União Europeia, 17% nos Estados Unidos e 19% na China. Estes países e regiões continuam sendo os que mais atraem cientistas e engenheiros imigrantes.
Por outro lado, só 10% dos pesquisadores na Ásia com doutorado migram, contra 32% dos que receberam o título no Reino Unido, e 19% dos doutores “produzidos” nos EUA migram, principalmente para a Ásia.
No resto do continente americano 13% dos doutores migram, a maior parte para os Estados Unidos.
Os dados mostram também um crescimento constante desde 1990 no número de cientistas estrangeiros imigrando para os EUA, mas em 2002, esse fluxo estagnou, possivelmente por causa dos ataques terroristas de 2001, só voltando a voltar a crescer significativamente em 2008.
As políticas contra imigração defendidas pelo presidente americano Donald Trump como um modo de supostamente reduzir o risco de atentados terroristas poderão afetar de novo esse fluxo.
JOHN BOUND
Cientista da Universidade de Michigan
Mas até que ponto essa mobilidade é benéfica para o país que recebe, e, principalmente, para o país que envia esses exóticos “animais” ao exterior? A migração de cientistas de um país para outro costuma ser chamada, afinal, de “drenagem de cérebros”.
Além da pesquisa, a “Science” convidou vários cientistas sociais para comentar o tema, em um momento em que “retórica e atos que viram manchetes mexem com paixões ao redor do globo”.
Os dados foram compilados da Orcid, uma organização sem fins lucrativos que atribui códigos de identidade para pesquisadores que não querem ser confundidos com outros com nomes iguais. Dos cerca de oito milhões de cientistas do planeta, três milhões têm códigos da Orcid.
Em um dos artigos que acompanham o estudo, Jennifer Hunt, da Universidade Rutgers, em Nova Jersey, EUA, diz que “há debates animados em países ao redor do mundo sobre o quanto os imigrantes contribuem para a economia. Minha pesquisa mostra que a imigração qualificada aumenta patentes, o que impulsiona o crescimento econômico per capita”.
Outros três autores —Giuseppe Scellato, da Politécnica de Turin, Itália; Chiara Franzoni da Politécnica de Milão, Itália; e Paula Stephan, da Universidade Estadual da Geórgia, EUA— trabalharam em uma pesquisa internacional sobre cientistas, a GlobSci Survey, realizada em 16 países, incluindo o Brasil.
“A intenção da nossa pesquisa foi analisar os efeitos da produtividade associados à migração no nível individual ou micro. Embora este não seja o nosso foco principal, nossa pesquisa aborda maneiras pelas quais a mobilidade é benéfica para os países do Terceiro Mundo”, declarou Stephan à Folha.
“Em primeiro lugar, na medida em que alguns migrantes retornam —e encontramos uma proporção maior do que a média de retornados no Brasil—, esses migrantes são mais produtivos do que indivíduos no país de origem que não foram móveis”, diz ela.
Em segundo lugar, afirma, os indivíduos móveis estão associados com o aumento da produtividade.
“E, em terceiro lugar, em um de nossos artigos, examinamos os padrões de colaboração de indivíduos móveis e nossos resultados indicam que os indivíduos móveis colaboram com indivíduos em seu país de origem”, diz ela.
Para John Bound, da Universidade de Michigan, nos EUA, a possibilidade de migração pode ter dois efeitos positivos sobre a força de trabalho científica nos países de origem. Ela pode incentivar o estudante talentoso no país em desenvolvimento a buscar instrução científica e há a migração de retorno.
“No nível de doutorado,
BRENO GOMIDE BRAGA
Economista que estuda nos EUA Taiwan, Coreia do Sul e China se beneficiaram significativamente dos migrantes que retornaram. No contexto da indústria de tecnologia de informação, ambos os mecanismos beneficiaram a Índia. Para que isso funcione, é importante que os países emissores tenham instituições que apoiem estudantes e cientistas que retornam”, disse.
O economista brasileiro Breno Gomide Braga trabalha com Bound nos EUA. “Concordo com o John, mas também tenho um argumento a acrescentar. A migração de cientistas pode ser também benéfica para o Brasil porque muitos cientistas continuam pesquisando temas de interesse do país mesmo morando no exterior”, disse.
“Parte da minha pesquisa é relacionada ao Brasil. O meu centro de pesquisa me fornece recursos que dificilmente encontraria em uma instituição brasileira. Isso influencia na qualidade do meu trabalhos sobre a economia brasileira. O mesmo se aplica a um cientista estudando uma vacina contra o vírus da zika em uma universidade os EUA.”
“
Taiwan, Coreia do Sul e China se beneficiaram dos cientistas que retornaram. As instituições têm que apoiar essa volta “
A migração de cientistas também pode ser benéfica para o país emissor. Parte da minha pesquisa é sobre a economia do Brasil