GOVERNO ENCURRALADO Perito da Lava Jato contesta laudo de Temer
Fábio Salvador diz não ser possível tirar conclusões de forma tão rápida e sem ter o aparelho original de gravação
Ricardo Molina, contratado pela defesa do presidente, atestou que áudio não pode ser usado como prova
O chefe da perícia da Polícia Federal na Operação Lava Jato em Curitiba, Fábio Salvador, afirmou que é uma “humilhação” a contratação de um perito particular pela defesa de Michel Temer no caso das gravações feitas por Joesley Batista, da JBS.
O advogado convocado pelo presidente, Antônio Claudio Mariz de Oliveira, contratou o perito Ricardo Molina para avaliar o áudio, diante da desconfiança do governo de que havia edições e cortes no material que foi entregue para o Ministério Público.
Na segunda (22), Molina afirmou que o material não pode ser usado como prova e apontou “obscuridades”.
Salvador criticou a apresentação de um laudo em tão pouco tempo, cerca de 24 horas, e sem a análise do aparelho usado para gravar.
“Isso demonstra um interesse, uma motivação. Que tem um viés”, disse à Folha o chefe da perícia.
“É decepcionante o uso que está se fazendo da expressão perito criminal. É uma humilhação”.
A PF recebeu um dos gravadores utilizados pelo empresário. O segundo aparelho foi entregue na noite desta terça. Ao Supremo Tribunal Federal, a polícia afirmou que vai demorar 30 dias para ter uma conclusão.
“O que difere um perito profissional daqueles que se dizem peritos é o comprometimento com a missão institucional. Nós só temos uma missão, que é apurar a verdade dos fatos. Não sofremos influências externas como peritos contratados. Somos independentes”, finalizou.
A Folha também contratou uma perícia. Segundo esse laudo, há ao menos 50 edições no áudio entregue por Joesley Batista.
A gravação de Temer por Joesley Batista foi feita em março e usada para a negociação de um acordo de delação premiada, homologado há dez dias. (BELA MEGALE E CAMILA MATTOSO) ANÁLISE DO EQUIPAMENTO Essa verificação não é necessária em todos os casos. É preciso conhecer o funcionamento do aparelho (suspende gravações quando não há som para economizar bateria?). O perito em engenharia eletrônica pode realizar testes para eliminar ou confirmar hipóteses para causas. Em alguns casos, é possível reproduzir as falhas e determinar que as simulações não são iguais às causadas pelo instrumento
Técnicas usadas por especialistas de diversas áreas para identificar eventuais interrupções em gravações
DIGITALIZAÇÃO Se a mídia for analógica, é feita uma digitalização. Se for digital, é realizada uma cópia forense para coletar arquivos ativos ou deletados e para não danificar a evidência durante a análise da prova. É importante o registro de todas as interações com a evidência, fundamental para dar valor probante. Peritos em tecnologia da informação procuram dados sobre os arquivos e marcadas de softwares usados em edições DECOMPOSIÇÃO FREQUENCIAL AO LONGO DO TEMPO DA LOCUÇÃO “FOLHA DE S.PAULO” O gráfico abaixo, chamado de espectrograma, é um dos instrumentos utilizados por peritos para analisar a variação dos sons em diversas frequências; esse nível de detalhamento serve para identificar, por exemplo, variações inesperadas ANÁLISE PERCEPTUAL E CONTEXTUAL Em seu laboratório, o perito ouve o áudio em busca de pontos de alerta, que são considerados potenciais falhas ou edições (retirada ou inserção de trechos). Um profissional experiente, munido com um bom fone de ouvido, pode identificar variações no ruído de fundo (barulho de motor, por exemplo), mudanças abruptas do padrão de entonação etc. Nessa fase, é verificada a coerência lógica do diálogo, dos sons ambientes e de elementos como a prosódia, parte da fonética que estuda traços da fala como tom e ritmo. Por exemplo, uma frase com muitas palavras pode fazer com que cada uma delas, em separado, seja articulada de modo mais rápido do que se estivesse numa expressão com menos palavras. A inserção abrupta de um trecho causaria estranhamento ANÁLISE FÍSICO-ACÚSTICA Com auxílio de equipamentos analógicos ou softwares, o perito passa a enxergar o som por meio de gráficos para analisar a intensidade do sinal e a frequência do som ao longo do tempo. É nesse momento que o profissional vai se aprofundar na análise das possíveis descontinuidades, variações abruptas ou ausência de som em todas as frequências (que pode caracterizar uma interrupção)