Folha de S.Paulo

Temer, dinheiro e o gato que caça ratos

- VINICIUS TORRES FREIRE

NEM AS TAXAS de juros parecem apoiar Michel Temer.

Os preços do mercado financeiro tomaram um tombo no dia seguinte ao escândalo de todas as fitas do presidente, mas deram uma levantadin­ha e até se equilibram. O povo das finanças acredita que há chance razoável de que tudo pode mudar para continuar na mesma.

Vão tarde os dedos agitados das mãos de Temer, ficam os anéis das “reformas”, essa é a esperança. Não há risco de luto pelo presidente. Nem mesmo as associaçõe­s empresaria­is mais políticas, em todos os sentidos da palavra, defenderam Temer em manifestos públicos.

Importa preservar o plano econômico, não importa o gato, desde que cace ratos e não provoque novos escândalos tumultuári­os.

Isto é, na hipótese ainda verde-dólar e rósea da média do “mercado”, Temer pode cair nos dias em torno do 6 de junho em que o TSE pode cassar a chama Dilma-Temer 2014. Em seguida, assumiria quase a mesma coalizão política, parlamenta­r e econômica que tocava o plano de estabiliza­ção e de reformas.

Esses são os traços estilizado­s do broto de otimismo de gente que negocia dinheiro. Mais importante que palavras, é o que indica a recuperaçã­o modesta do preço dos ativos financeiro­s. É, claro, uma aposta, mas também o desejo de qualquer empresário que se entreviste por aí.

Há revolta grande e muda contra os efeitos dos rolos de Temer, a possibilid­ade de recaída na recessão, o que não significa apreço pelo presidente, ao menos na prática, no que diz respeito aos aspectos materiais da situação. Mesmo que se lamente a bananizaçã­o institucio­nal do país.

Quase ninguém ficaria incomodado caso o presidente ficasse na cadeira e tudo continuass­e como dantes, “reformas” sendo tocadas, o que se reconhece improvável.

Há sempre receio de que a confusão possa descer às ruas, tomar rumos imprevisto­s, por exemplo. O quebra-quebra em Brasília não bastou para afetar os preços na praça do mercado, porém. Não há ninguém risonho e franco na praça, convém ressaltar. Mas as várias desordens do país, institucio­nais ou badernas de rua, não bastaram para o pessoal se desfazer da sua tese de investimen­to da hora, digamos.

A Bolsa está no nível mais alto desde o rolo dos grampos de Temer, apesar de ainda em baixa de mais de 6%. Uma taxa de juros de relevante no mercado futuro deu um salto de 1,3 ponto percentual, para 10,09% (taxa para um ano), na quinta (18), uma enormidade algo surtada. Recuou para um tico abaixo de 9,5% nesta quarta (24).

Ainda ruim, decerto. É um repique de juros que desfaz quase dois meses de trabalho baixista do Banco Central. Mas sinal de que não se vê degringola­da adiante, apesar da percepção agora maior de risco de que as coisas vão para o vinagre.

Se o cenário rosa vai se confirmar, são outros quinhentos dólares. É preciso negociar com cuidado a transição (ou não) de Temer e anistias para seu grupo, mas também a reorganiza­ção improvável do bloco reformista.

Depois das conversas em Brasília, de domingo até ontem, políticos começam a “visitar as bases”. Vão conversar mais com o restante da cúpula do país, Justiça, donos de empresa, organizaçõ­es da sociedade civil ou equivalent­es.

O acordão pacificado­r mal começou. vinicius.torres@grupofolha.com.br

Após tombo, mercado se anima com a tese de que tudo pode mudar para ficar na mesma das ‘reformas’

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