Exterminadora do futuro, outra vez
Crise atinge sobretudo os jovens
últimas quatro décadas, tais como a volta gradual da democracia a partir dos anos 1980, a estabilização da inflação em meados dos anos 1990 e a queda da desigualdade de renda nos anos 2000.
Nos dias correntes, marcados pela corrupção, o repúdio consensual contra os desvios de recursos guarda a promessa de unir um país ainda mais dividido.
Não basta, contudo, que a sociedade reaja coesa ao inadmissível. É preciso distinguir as condições necessárias das suficientes.
A agenda de transformações que se impõe tem essa natureza coletiva e temporal. A dificuldade de reformar a Previdência é fruto dessa jabuticabeira: cada um espera muito para si e não enxerga o outro. PAÍS IMATURO A satisfação com a vida no presente é relativamente estável em todas as faixas etárias mundo afora. Já a expectativa de contentamento no futuro cai com o avanço da idade, passando de 7,4 pontos, aos 15 anos, para 5,5 depois dos 80 anos.
Juventude é um estado de espírito, marcado pela atitude diante do futuro. O jovem acredita que o melhor ainda está por vir. Como mencionado, somos eneacampeões mundiais de expectativa de felicidade futura —ou de atitude jovem. O que nos permite reconciliar duas qualificações atribuídas ao Brasil: “país do futuro”, para alguns, “país jovem”, para outros. indivíduos com idades de 15 a 19 anos, a queda foi de 13% por ano.
Se nada for feito quanto à Previdência, será só o início de uma longa derrocada. É o tal autoengano exterminador do futuro.
As manifestações de rua de junho de 2013 protagonizadas pelos jovens pareciam, aos olhos de hoje, antever esse tombo. Elas não foram exclusividade brasileira. A Primavera Árabe, a mobilização estudantil no Chile e os protestos nas periferias de metrópoles europeias refletem a frustração juvenil potencializada e instrumentalizada pelo uso intensivo das redes sociais. O jovem está com dificuldade de se encaixar no velho mundo.
Apesar dos progressos notáveis nas últimas décadas em temas como pobreza, acesso a bens e serviços e expectativa de vida, estamos perdendo a guerra nas ações voltadas à juventude. Problemas típicos dessa faixa etária, como violência, desemprego, acidentes de trânsito, uso de drogas e prisões, só têm piorado.
Estudos mostram que a combinação desses infortúnios os torna ainda mais devastadores. Por exemplo, Mônica Viegas e Marcos Lisboa (“Mortalidade nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais”) relacionaram a crise de desemprego juvenil dos anos 1980 a sequelas permanentes na taxa de homicídio daquela geração. REFORMAR O FUTURO Os “baby boomers” nascidos no pósSegunda Guerra constituíram a geração dos jovens de 1968 que muito revolucionou ideias e costumes. Têm muito a ensinar. Está na hora de os jovens do novo milênio, nascidos até a virada do século, fazerem valer seu tamanho, reformando seu futuro. Não há hoje questão econômica mais premente para a juventude do que a previdenciária.
Gostaria de ver uma reforma da Previdência mais voltada para a instituição de princípios de um sistema de capitalização, com mais isonomia entre setores público e privado, com menos privilégios aos primeiros e mais cuidado com os pobres. Mas ela é apenas o começo. Outras virão.
A resistência em relação à reforma não só joga contra o nosso futuro coletivo como atenta contra o presente. Não falo de crescimento a longo prazo, nem mesmo do mecanismo de antecipação dos problemas fiscais de que somos lembrados todos os dias pelas flutuações dos mercados financeiros. Refiro-me à miopia mesmo em relação à economia cotidiana.
No Brasil, temos robusta restrição de oferta e, agora, de demanda agregada. Se quisermos recuperar a economia logo, a contrarreforma da Previdência (leia-se, a inação) é péssimo impulso de demanda. Quase tão ruim quanto a liberação do FGTS ou o aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda.
A Previdência tem efeitos multiplicadores sobre o PIB de menos de 1/3 do observado no Bolsa Família. Por quê? O segundo vai para o pobre, que consome toda a renda, fazendo a roda da economia girar.
Incrementos na Previdência quase não chegam ao pobre. Aposentadorias e pensões correspondem hoje a 6,3% da renda dos 5% mais pobres e a 19,5% da renda dos 5% mais ricos. Se não ajustarmos a seguridade social, vamos continuar transferindo renda para quem tem mais e gasta menos.
Se não avançarmos na reforma da Previdência, vamos cair numa estagnação secular. Ficaremos todos, e os jovens em especial, deitados eternamente em berço não esplêndido.