Folha de S.Paulo

Curiosamen­te, o atual processo de redução da mata atlântica no sul da Bahia tem

- EDUARDO GERAQUE

O ciclo de destruição da floresta atlântica, que começou em 1500 por causa dos europeus, volta a ficar ativo na Bahia, revelam dados de um mapeamento florestal da ONG SOS Mata Atlântica e do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

Muito impulsiona­da pela redução da mata na região sul do Estado, a Bahia foi campeã nacional de desmatamen­to da vegetação atlântica entre 2015 e 2016, segundo o atlas do desmatamen­to a que a Folha teve acesso.

No Estado, caíram 12.288 hectares de vegetação, um cresciment­o de 207% em relação à análise anterior, de 2014-2015. Três cidades do sul da Bahia —Santa Cruz de Cabrália, Belmonte e Porto Seguro— são responsáve­is por metade desse total.

Bioma onde vivem 72% da população brasileira, a mata atlântica se estende do Rio Grande do Sul ao Piauí.

Em todo o país, a derrubada aumentou 57,7% no período em comparação ao ano anterior. Houve uma redução de 29.075 hectares de floresta.

O índice preocupa os especialis­tas da SOS Mata Atlântica. Há 10 anos não havia uma derrubada do bioma nessas proporções. CABRÁLIA componente­s que remetem ao ciclo histórico dos tempos coloniais. Alguns fatores geográfico­s e socioambie­ntais do desmate não mudaram.

A primeira missa em solo brasileiro ocorreu na região da atual Santa Cruz de Cabrália. Lá os índios viviam em meio a uma rica floresta, e o pau-brasil logo virou valiosa matéria-prima, motivando disputas pelo território.

Durante dois séculos, entre 1500 e 1700, estimativa­s científica­s indicam que mais de 460 mil árvores da espécie que dá nome ao Brasil acabaram ceifadas da exuberante floresta, hoje conhecida pelo nome de mata atlântica.

O processo colonial de desmatamen­to, que praticamen­te acabou com o pau-brasil, envolveu dos donos dos negócios (os europeus que exportavam a madeira e faziam os corantes) aos índios, que faziam o escambo. Em um segundo período, também os escravos participar­am.

Todos, por vários tipos de pressão ou dominação, participar­am do aniquilame­nto.

A mesma Cabrália, além de Belmonte e Porto Seguro, aparecem na lista dos cinco maiores desmatador­es (veja quadro à dir.).

A partir das coordenada­s do satélite, a expedição de campo, via estradas de terra entre propriedad­es privadas desertas, dá formato à destruição. Após dois dias percorrend­o o sul da Bahia, a diretora-executiva da SOS Mata Atlântica, Marcia Hirota, resume: “É muito triste”.

Os números captados pelas análises mostram que em Cabrália houve o desmate de 3.058 hectares de mata atlântica, mais de 10% do que caiu de todo o bioma no país.

Ainda não são claras as ra- OS DEZ MUNICÍPIOS QUE MAIS DESMATARAM Em hectares Santa Cruz de Cabrália* (BA) Belmonte* (BA) Manoel Emídio (PI) Wanderley (BA) Porto Seguro* (BA) Águas Vermelhas (MG) Canto do Buriti (PI) Alvorada do Gurguéia (PI) São João do Paraíso (MG) Jequitinho­nha (MG)

MARCIA HIROTA

diretora-executiva da ONG SOS Mata Atlântica

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