Atuação de ONG é relevante, mas não dá para falar em sucesso
Apesar da vigilância sistemática da SOS Mata Atlântica, criada em 1985, muito pouco resta da floresta tropical
Quando um grupo de estudantes da USP se revoltou contra o plano de construir um aeroporto nas matas de Caucaia do Alto (periferia de São Paulo), ali por 1978, poucos poderiam imaginar que começava a nascer um dos mais bem-sucedidos projetos ambientalistas do Brasil.
Os jovens fundaram uma das primeiras ONGs verdes do país, a Oikos, em 1980. Após cinco anos, o grupo deu origem à SOS Mata Atlântica, que iniciou mapeamento dos remanescentes da floresta tropical que recebeu os portugueses e abrigou seus descendentes por cinco séculos, pagando alto preço por isso.
Graças a esses idealistas com senso prático e pendor científico, conta-se hoje com uma valiosa série histórica sobre o desmatamento no bioma que deu ao país nascente sua primeira fonte de renda, o pau-brasil. E, por extensão, seu nome próprio.
No entanto, quando essa vigilância sistemática começou, há três décadas, já restava muito pouco a preservar: não mais que 181 mil km² do total original de 1,3 milhão de km². Ou seja, 86% da mata atlântica já haviam sucumbido à aversão brasileira pelo “mato” quando aquela moçada passou a tentar nos convencer de que isso era um desastre.
Desde então, outros 19 mil km² se perderam, uma área equivalente a quase um Sergipe inteiro. A primeira floresta brasileira avistada se reduz a 12,5% do que era.
Seria decerto muito pior se a vigilância desencadeada pela SOS Mata Atlântica não tivesse existido, mas não dá para falar em sucesso.
É o Brasil inteiro que falha quando se mostra incapaz de preservar a floresta que recicla os recursos hídricos de que depende a maior parte de sua população, ainda concentrada nas capitais que margeiam a costa do oceano Atlântico.
Nem mesmo a recomposição ora em curso pode, com honestidade, ser encarada de modo otimista.
Embora seja um fato positivo, não se trata de obra humana, mas de seu afastamento: o que ressurge da mata atlântica se dá por regeneração natural, principalmente, e não porque o replantio estimulado por ONGs como a SOS tenha alcançado escala significativa. REGENERAÇÃO Foram quase 2.200 km² de regeneração de 1985 a 2015, pouco menos que uma vez e meia a superfície da cidade de São Paulo. Cotejada com os 19 mil km² desmatados no mesmo período, a cifra não chega a ser animadora.
Isso não é motivo, decerto, para esmorecer. Não só porque o que resta da mata atlântica merece ser preservado por seu valor histórico, paisagístico e de biodiversidade, mas também por razões práticas: precisamos da água que ela produz para sobreviver.