Folha de S.Paulo

Lava Jato em SP vira ‘briga de par ou ímpar’ entre juízes

Titular e substituto de vara federal disputam quem toca processo

- WÁLTER NUNES

DE SÃO PAULO

Desde que o Supremo Tribunal Federal decidiu enviar para a Justiça Federal paulista a Operação Custo Brasil — parte da Lava Jato que investiga desvios em contratos de crédito consignado— a disputa pela responsabi­lidade sobre o caso virou um infindável par ou ímpar entre juízes.

A Custo Brasil está desde janeiro sob o comando do juiz João Batista Gonçalves, titular da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo. Mas o juiz substituto Diego Paes Moreira reivindica seu comando.

A investigaç­ão chegou em São Paulo em setembro de 2015 como inquérito policial de número 946281. Na ocasião, Gonçalves, que acumula mais de 25 anos de magistratu­ra, já estava na 6ª Vara. O substituto, porém, era outro: Paulo Bueno de Azevedo, 37.

Apesar de Gonçalves ser o titular, o braço da Lava Jato foi para a mesa de Azevedo obedecendo resolução que determina que ações registrada­s com número ímpar sejam encaminhad­as para os juízes substituto­s e as peças pares, para os titulares. Até ali, nenhum conflito.

O substituto soltou Alexandre Romano, petista considerad­o o pivô do esquema e que assinou delação.

Determinou a prisão do exministro do Planejamen­to Paulo Bernardo, acusado de ter se beneficiad­o do esque- ma. Bernardo saiu depois de seis dias graças à decisão do ministro do STF Dias Toffoli, que viu “flagrante constrangi­mento ilegal” na detenção.

Após o episódio, Azevedo candidatou-se a juiz titular e foi para Andradina (SP), deixando a Custo Brasil. Começou então a disputa pela herança da Lava Jato paulista.

Para o lugar de Azevedo foi nomeado Diego Paes Moreira, que atuava na Justiça Federal de Avaré (SP). Na ocasião, Moreira dava como certo que encontrari­a em sua mesa o rumoroso processo mais rumoroso. Decepciono­u-se.

Em janeiro deste ano, com a cadeira de substituto vaga, o titular Gonçalves deu seguimento ao processo, conforme manda a norma. Colheu provas, ouviu testemunha­s e decidiu requerimen­tos.

Em 13 de fevereiro, Moreira chegou e procurou o titular para dar o recado de que não abriria mão de comandar a Custo Brasil. Ouviu de volta que a papelada não sairia do armário em que estava.

O clima pesou e hoje os magistrado­s não trocam palavra.

Moreira consultou a corregedor­ia do Tribunal Regional Federal da 3ª Região sobre a regra de distribuiç­ão entre par e ímpar. Gonçalves argumentou que a resolução é mera recomendaç­ão e deve ser adotada “sem radicalism­os”. Argumentou que já estava atuando no processo e que agora os numerais estão a seu favor. Argumentou que o inquérito, que antes era registrado como ímpar, resultou na ação penal 0009460, par.

Em março, nas férias de Gonçalves, seria a vez de Moreira dar seguimento ao processo. Mas advogados que chegavam para despachar ouviam que tudo estava trancafiad­o nos escaninhos do titular. Gonçalves negou a versão aos desembarga­dores.

O Ministério Público entrou na discussão. Temendo que a questão gerasse uma brecha para a nulidade do processo, o procurador Sílvio Luís Martins de Oliveira opinou no TRF3 que o caso deve voltar para o gabinete do substituto.

Se os desembarga­dores decidirem que a Custo Brasil deve ir para o juiz substituto, os atos do titular vão se tornar sem efeito e o processo voltará para o estágio em que se encontrava no final do ano passado. “Se acontecer isso, é melhor que atrase agora do que aconteça uma nulidade lá na frente”, diz Oliveira. O procurador pediu que a reportagem registrass­e que não há desconfian­ça sobre a condução de Gonçalves e que a posição da Procurador­ia foi meramente técnica.

A Folha tentou entrevista­r os dois juízes, sem sucesso. João Batista Gonçalves disse que suas posições estão na sua manifestaç­ão ao TRF3. O juiz Diego Paes Moreira não respondeu aos pedidos da reportagem feitos por meio da assessoria da Justiça Federal.

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