Caracas é tema de grupo de WhatsApp de chanceleres
O número de pedidos de asilo de venezuelanos no Brasil até abril já se aproxima do total registrado em todo o ano de 2016, mostra levantamento do Comitê Nacional de Refugiados feito pela Polícia Federal (PF) a pedido da Folha.
As estatísticas, recebidas nesta segunda-feira (29), mostram que 3.181 cidadãos caribenhos fizeram o pedido nos quatro primeiros meses do ano, contra 3.375 de janeiro a dezembro de 2016.
São computados nesse total todas as solicitações, sem especificar o status. O processo de refúgio completo costuma durar mais de um ano, e ao longo dele o candidato pode permanecer no Brasil.
No ano passado, a Venezuela foi o país de origem de 30% dos solicitantes de refú- gio no país —entre 2010 e 2013 a liderança era ocupada por países africanos, e em 2014 e 2015, pela Síria.
Outro exemplo do fluxo intenso rumo ao Brasil é a quantidade de entradas de venezuelanos, incluindo turistas e moradores da fronteira. Segundo a PF, foram 575 mil registros de ingresso no território nacional até o fim de abril, contra 947 mil em 2016.
A crise, porém, ainda não influenciou a emissão da carteira de identidade de estrangeiro. Houve 87.545 requerimentos no ano passado e 21.015 nos quatro meses.
As estatísticas também não mostram os efeitos resolução do Conselho Nacional de Imigração que libera a residência automática de dois anos aos venezuelanos e aos cidadãos de Guiana e Suriname, anunciada em março pelo governo de Michel Temer. CRISE HUMANITÁRIA O crescimento é uma das consequências do agravamento da crise humanitária no país governado pelo presidente Nicolás Maduro.
Relatório da ONG Human Rights Watch divulgado em abril revelou que a maioria dos imigrantes deixa sua terra natal em busca de atendimento médico e comida.
O intenso fluxo dos cidadãos do país vizinho levou ao colapso dos sistemas de saúde e de assistência social em Roraima e já começa a afetar o vizinho Amazonas.
Os números da PF também não mostram os efeitos na imigração dos dois meses da onda de protestos da oposição contra Maduro, que já deixaram 61 mortos. Rivais e aliados do chavista voltaram às ruas nesta segunda-feira.
Em discurso no fim da tarde, o presidente disse que a Assembleia Constituinte que deseja fazer é “Hugo Chávez vivo, doa a quem doer”.
Ele responde às críticas de ex-aliados, como a procuradora-geral, Luisa Ortega Díaz e dois juízes do Tribunal Supremo de Justiça, que consideram a troca da lei máxima uma violação do legado chavista.
É pelo aplicativo de celular WhatsApp que chanceleres latino-americanos debatem a crise na Venezuela e possíveis soluções, como a recriação de um “grupo de amigos” do país, à semelhança do instalado sob o governo Hugo Chávez (1999-2013), que dialogue com governo e oposição.
No grupo, interagem os próprios ministros de, ao menos, oito países: Brasil, Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai, Peru, Colômbia e México. “Nós discutimos muito frequentemente, trocamos informações e essa ideia [do grupo de amigos] está circulando nesse grupo”, disse o chanceler brasileiro, Aloysio Nunes, à Folha.
O debate iniciado no grupo será levado nesta quarta (31) à reunião extraordinária de chanceleres da OEA (Organização dos Estados Americanos), em Washington, para tratar da crise venezuelana. Nunes não disse quantos e que países já apoiam a ideia —apenas afirmou que o Brasil integrará a iniciativa.
“O Brasil está disposto e tem até uma necessidade [de ajudar], pela fronteira extensa [com a Venezuela], de mais de 2.000 km”, disse. “Teremos repercussões das crises política, humanitária e de segurança pública da Venezuela aqui no Brasil, assim como a Colômbia também tem.”
Nunes, contudo, admite que a aplicação da ideia dependerá da aprovação de Caracas —algo improvável se nenhum país bolivariano ou caribenho que seja mais próximo ao governo de Nicolás Maduro se juntar ao grupo.
Segundo o chanceler, ainda não há adesão do Caribe. “Mas é importante que eles participem, pois é um grupo que, se for constituído, tem que ser gente que tenha trânsito dos dois lados”, disse.
O primeiro “grupo de amigos da Venezuela” foi criado em 2003 sob a liderança do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que tinha trânsito com o presidente Hugo Chávez —o que não se pode dizer da relação entre os governos Temer e Maduro. Participavam Brasil, Chile, Espanha, México, Portugal e EUA.
Na época, a OEA, sob o comando do colombiano César Gaviria, tinha entrada e já fazia parte dos esforços de diálogo —algo impensável hoje.
A Venezuela critica o atual secretário-geral do organismo, o uruguaio Luis Almagro, e anunciou sua saída da OEA após o conselho permanente convocar a reunião extraordinária desta quarta. REUNIÃO COM EUA Nunes aproveitará a ida a Washington para se reunir com o secretário de Estado americano, Rex Tillerson, na sexta (2). Será o segundo chanceler brasileiro que Tillerson encontrará em quatro meses de governo Trump — ele esteve na Alemanha com José Serra, que deixou o cargo para tratar da saúde.
Na pauta, estarão Venezuela, temas bilaterais (como comércio, defesa, saúde, ciência e tecnologia) e globais (como terrorismo e Coreia do Norte), disse o ministro.