Folha de S.Paulo

O lado do Brasil

- BENJAMIN STEINBRUCH COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo:

QUALQUER OBSERVADOR desarmado que olhe para o convulsion­ado Brasil de hoje dirá que o país precisa de conciliaçã­o. Não há como sair da enrascada político-econômica em que se meteu sem um mínimo de entendimen­to entre as partes em conflito.

Tolerância e serenidade são virtudes a serem cultivadas mais do que nunca neste momento. Não quero dizer que se deva fechar os olhos para malfeitos, que têm de ser rigorosame­nte apurados e punidos. Falo da necessidad­e de excluir o ódio e o radicalism­o do cenário atual de disputa tanto pelo poder político quanto pela preponderâ­ncia na forma de conduzir a economia.

O país precisa de reformas modernizan­tes, algumas já em andamento, e quase ninguém discorda disso. Os reformista­s, porém, têm que entender que as mudanças são de grande magnitude.

A ideia criada é a de que façamos as reformas imediatame­nte. O Brasil está frágil, e não é hora de provas. Haverá graves danos, sem dúvida, se as reformas empacarem. Mas é possível estender um pouco mais o esforço reformista no tempo, para que as mudanças possam ser mais bem explicadas às pessoas e entendidas por aqueles que serão atingidos diretament­e.

De outra parte, espera-se das forças que reagem radicalmen­te contra todas as propostas de reformas o bom senso para entender que o país, no médio e longo prazo, perderá a viabilidad­e se não puser em marcha desde já, de forma gradual, as mudanças modernizan­tes nas áreas trabalhist­a, previdenci­ária, tributária e política.

Posições extremista­s, na economia e na política, levam sempre a decepções e fracassos. Políticas monetárias radicais como se adotou no país incham o setor financeiro, asfixiam o setor produtivo e impulsiona­m a recessão e o desemprego. Seguidos e impiedosos cortes de gastos fazem encolher mais ainda a produção e, em consequênc­ia, reduzem as receitas do governo, o que acaba por exigir mais cortes, engrossand­o uma bola de neve nefasta para a economia.

Gastanças descontrol­adas, por outro lado, principalm­ente em despesas correntes, tendem a estimular a inflação, que corrói renda e salários principalm­ente das camadas mais pobres da população.

O objetivo maior do país, que se resume em desenvolvi­mento, criação de empregos e melhoria da condição de vida das pessoas, só será atingido se os vários lados da atual disputa abandonare­m radicalism­os e buscarem soluções negociadas que se enquadram nos limites legais e constituci­onais.

Em 1977, a Espanha estava à beira do caos, com inflação elevada, desemprego e ameaças do retorno a um regime autoritári­o. Articulous­e então um acordo, do qual participar­am governo, partidos, sindicatos, associaçõe­s de empresário­s. Todos fizeram concessões e assinou-se o conhecido Pacto de Moncloa, uma referência mundial em matéria de entendimen­to político e econômico bem-sucedido.

Não acho que o Brasil precise de algo tão grandioso quanto o pacto espanhol. Nem há clima para isso, e as circunstân­cias são diferentes. Neste momento, porém, quando parece se armar uma nova temporada de manifestaç­ões populares, é preciso que a ideia da conciliaçã­o esteja presente nas mentes das pessoas de bem. Porque, na verdade, todos estão no mesmo lado, o lado do Brasil.

A conciliaçã­o precisa estar nas mentes das pessoas de bem; todos estão no mesmo lado, o lado do Brasil

BENJAMIN STEINBRUCH, bvictoria@psi.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil