Multas por barulho despencam sob Doria
Prefeito adota discurso duro contra excesso de ruído, mas penalidades do Psiu caem pela metade no começo de 2017
Estrutura de órgão conta com só 13 fiscais; gestão tucana promete ampliar as equipes com agentes das regionais
O prefeito João Doria (PSDB) mandou um recado enfático no começo de fevereiro, ao participar de uma blitz da lei do barulho, que lacrou um bar no Tatuapé (zona leste de São Paulo): “Isto a partir de agora serve de alerta para os donos de estabelecimentos. A lei do Psiu agora volta, e volta para valer”.
Os resultados da fiscalização no começo de 2017, no entanto, têm indicado uma situação bem diferente da fala dura adotada pelo tucano.
No primeiro trimestre, as multas aplicadas pela prefeitura a estabelecimentos por excesso de ruído caíram pela metade: foram só 84, contra 169 em igual período de 2016.
A tendência se repetiu no mês seguinte ao discurso de Doria —quando foram só 27 multas, contra 55 em março do ano passado. Os dados disponíveis de abril e maio indicam que a fiscalização continua tímida, embora, neste caso, a prefeitura ressalve que são preliminares, faltando cadastrar parte das penalidades.
A quantidade de multas do Psiu (Programa de Silêncio Urbano) é a mais baixa em, no mínimo, quatro anos. Mesmo antes já ficava muito aquém do volume de queixas de barulho feitas pelos paulistanos.
No ano passado, foram 30.159 reclamações, das quais apenas 770 resultaram em punição de estabelecimentos.
“O Psiu existe há 20 anos, e faz 20 anos que não funciona. É um serviço inexistente”, afirma a arquiteta Lucila Lacreta, presidente do Movimento Defenda São Paulo.
A estrutura do órgão conta com apenas 13 fiscais. Doria promete ampliar as equipes com a inclusão de agentes das prefeituras regionais.
Além do baixo número de fiscais, técnicos avaliam que mudanças na legislação podem ter criado dificuldades.
Em março do ano passado, com a promulgação da Lei de Zoneamento, limites de ruído em zonas mistas (que reúnem residências e endereços comerciais) passaram de 45 para até 50 decibéis.
“Aumentar os níveis de ruídos permitidos torna a situação mais permissiva para os geradores de ruído”, disse Tom Green, que foi estudar a questão após brigar por mais de 17 anos contra os transtornos de uma casa noturna vizinha a sua residência, na Vila Madalena (zona oeste).
O professor Daniel Pilatti, 38, também trava uma batalha há pelo menos três anos contra dois bares na rua onde mora, no Ipiranga (zona sul). Conta que fez diversas reclamações pelo telefone 156, da prefeitura, para a polícia e até organizou um abaixo-assinado com vizinhos para entregar na prefeitura regional.
Nada adiantou. A última tentativa foi uma ação que protocolou na Justiça. “Muitas vezes a gente saiu de casa para não ter que aguentar barulho. E trocamos a janela do quarto para antirruído.”
Sua namorada, a artista plástica Andrea Lourenço, 43, conta que os fiscais fizeram inspeções em datas em que os bares estava fechados. Após a Justiça ser acionada, um dos bares não abriu mais. O outro continua com música ao vivo sem nenhum tipo de acústica. “É deboche”, diz Pilatti.
A coordenadora de finanças Patrícia Silva Primo, 37, perdeu a conta de reclamações registradas no 156 por causa de um lava-rápido ao lado do prédio onde mora e que se transforma em ponto de música ao vivo na Vila Formosa (zona leste). “Moro aqui há 13 anos e nunca tinha tido isso. Não tenho mais final de semana, parece que a música está dentro do meu quarto.”
O engenheiro Julio Brandão Roll, 24, reclama do barulho de uma obra a 20 metros do prédio onde mora, no Paraíso, onde há descarga de caminhões de madrugada. “A prefeitura deu um prazo risível de 60 dias para fiscalizar.”