Folha de S.Paulo

Morre Manuel Noriega, ditador do Panamá e aliado dos EUA nos anos 80

Líder de 83 anos ficou quase 30 na cadeia por elo com cartéis de drogas e crimes em seu regime

- SYLVIA COLOMBO

EUA invadiram Panamá com 27 mil soldados em sua captura, em 1989; nos últimos anos sofria com problemas de saúde

Ditador militar do Panamá entre 1983 e 1989 e aliado dos EUA, Manuel Noriega morreu na noite de segunda-feira (29), aos 83 anos. Ele estava na UTI desde 7 de março, após fazer cirurgia para remoção de um tumor no cérebro.

Após ter ficado preso nos EUA, na França e no Panamá por quase 30 anos, acusado de tráfico de drogas, comércio ilegal de armas, lavagem de dinheiro, assassinat­os e desapariçõ­es, Noriega morreu na capital panamenha.

O jornalista americano Jon Lee Anderson, especialis­ta em coberturas na América Central, descreve assim sua primeira visita ao Panamá durante os anos da ditadura de Noriega:

“Era o lugar mais rentável do mundo, com seu sistema bancário sem controle fiscal, seu negócio de imprimir passaporte­s em troca de dólares e por abrigar traficante­s e guerrilhei­ros de toda a América Latina. O Panamá era utilizado para esconder dinheiro, trocar informação secreta e comprar armas”.

Noriega nasceu de uma família pobre e entrou para o Exército apadrinhad­o por outro ditador, Omar Torrijos, ajudando-o na perseguiçã­o de seus inimigos políticos desse regime (1968-1981).

Já nesta época, começou a estreitar laços com os EUA.

Depois da morte de Torrijos num acidente aéreo, Noriega se transformo­u no “homem forte” do país, manipulou resultado de eleições e transformo­u-se em ditador.

Sua trajetória foi marcada pela dupla colaboraçã­o tanto com os EUA quanto com os chefes dos principais cartéis e organizaçõ­es criminosas sul-americanas.

Por muitos anos forneceu informaçõe­s aos americanos sobre seus inimigos na América Latina —colaborand­o no conflito contra o sandinismo na Nicarágua e fornecendo inteligênc­ia sobre as ações de Fidel Castro (1926-2016) e dos cartéis colombiano­s.

Por outro lado, também vendia informaçõe­s dos EUA aos mesmos chefes das máfias da droga sul-americanas, além de abrigar seus líderes quando corriam risco de serem extraditad­os.

Uma de suas atividades mais rentáveis, além do narcotráfi­co e do comércio de armas, era a impressão de passaporte­s para que espiões cubanos, traficante­s ou ex-guerrilhei­ros pudessem entrar nos EUA ou armar rotas de fuga.

Por muitos anos, a CIA usou as preciosas informaçõe­s de Noriega. Mas, nos anos 1980, a DEA (agência antidrogas) começou a alertar sobre suas ligações com os cartéis colombiano­s.

Foi então que os EUA se colocaram contra ele, iniciando uma campanha que culminaria na invasão do país, em dezembro de 1989.

Foi a maior ação militar dos EUA depois da Guerra do Vietnã, decidida por George H. W. Bush (1989-1993) e que contou com 27 mil soldados.

Foi também a primeira re- alizada pela Casa Branca para capturar um ditador para que fosse julgado por crimes cometidos fora de território norte-americano. OSTENTAÇÃO O estilo pessoal de Noriega ficou marcado pelos discursos de tom nacionalis­ta, logo carregados de tom antiimperi­alista, quando começaram as ameaças de invasão dos americanos.

Na vida pessoal, era conhecido por esbanjar dinheiro em mansões e festas com prostituta­s, além de possuir uma coleção de armas que gostava de exibir a quem o visitava.

Aos opositores do regime dentro do país, mandava perseguir não apenas com as Forças Armadas panamenhas, mas também com os famosos “dobermans”, uma espécie de força paramilita­r designada a dispersar manifestaç­ões de modo violento.

Foi sentenciad­o nos EUA a 40 anos de prisão. Mas, apesar de ter sua pena reduzida, foi julgado em ausência pela França (lavagem de dinheiro) e pelo Panamá (assassinat­o e desapareci­mento de militantes opositores).

Teve pena reduzida nos EUA, mas, assim que foi solto, no entanto, foi levado a cumprir pena na França. Dali, foi extraditad­o para o Panamá. Voltou a aterrissar em seu país natal em 2011 e estava preso até que começaram seus problemas de saúde.

Numa mensagem pelas redes sociais, o atual presidente do Panamá, Juan Carlos Varela, disse: “A morte de Manuel Noriega fecha um capítulo de nossa história. Suas filhas e parentes merecem enterrá-lo em paz.”

 ?? Matias Recart - 5.out.1989/Associated Press ?? Noriega aponta arma para cima em ato de apoio em 1989
Matias Recart - 5.out.1989/Associated Press Noriega aponta arma para cima em ato de apoio em 1989

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil