Fingindo ser ladrão
RIO DE JANEIRO - Na semana passada houve um arrastão no Centro do Rio, durante a madrugada, que exemplificou perfeitamente o estado atual de desgoverno e insegurança da cidade.
Cerca de 40 criminosos vindos do morro da Providência —onde há uma Unidade de Polícia Pacificadora— saquearam mais de dez lojas numa rua a poucos metros da Secretaria de Segurança, do Comando Militar do Leste e de uma delegacia.
Fizeram-no com tal tranquilidade que passaram mais de duas horas nessa ação, valendo-se de dois caminhões para fechar a rua e carregar os produtos pilhados. O alarme das lojas foi acionado e uma patrulha da PM apareceu, mas não pôde com os criminosos, armados com fuzis. Saiu atrás de reforços, que só chegaram horas depois.
O roubo foi uma demonstração de força do tráfico, que está buscando expandir sua fonte de lucro por meio da cobrança de uma “taxa de segurança” dos comerciantes —tática mais associada às milícias. Como os lojistas se recusavam a pagar, os traficantes da Providência mostraram na prática que, sem acordo com eles, não há segurança para a região.
Nem mesmo proteção privada é solução, como mostra o episódio mais incrível dessa história, revelado pelo site G1: o segurança de uma das lojas chegou para trabalhar na madrugada e topou com o saque generalizado.
Negro, armado, sozinho contra um “bonde” de dezenas numa rua escura, não teve dúvida: ou se misturava à turba ou poderia ser confundido com um policial. Assim o fez, passando por ladrão para sobreviver, como contou a seu patrão.
Traficantes de um morro “pacificado” fazem um mega-arrastão de horas para punir comerciantes que não lhes pagavam caixinha, a polícia não impõe resistência e um segurança privado finge ser ladrão para não morrer. Eis aí uma aula de Rio de Janeiro. marco.canonico@grupofolha.com.br