Folha de S.Paulo

Governo Temer é o oxigênio do PT

- RONALDO CAIADO COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado;

AS PESQUISAS de opinião durante o impeachmen­t de Dilma Rousseff constatava­m a ruína política e moral do PT; registrava­m até 95% de rejeição. O petismo parecia, enfim, banido da história.

Nas ruas, em manifestaç­ões que chegaram a reunir mais de 6 milhões em todo o país —1,5 milhão só em São Paulo—, o grito uníssono era “Fora, PT”, “Fora, Dilma”, Fora, Lula”.

A rejeição já continha dose de hostilidad­e aos políticos em geral, processo q ue se agravaria com os desdobrame­ntos da Lava Jato. Incluo-me entre os poucos que não eram rejeitados nas manifestaç­ões.

Foi naquela ocasião, em 2015, que, diante do que antevia —e a presente crise o confirma—, propus a convocação de eleições diretas e gerais. Não via, como não vejo, outra saída.

Estava no primeiro ano de um mandato de oito anos, de senador por Goiás, e me dispunha a cortar na própria carne, voltando a enfrentar as urnas. Não faz, pois, sentido os que hoje, para espanto geral, defendem eleições indiretas me acusar de agir em causa própria. Do ponto de vista pessoal, tenho mandato até 2022, mas a democracia corre o risco de não chegar até lá.

A pergunta é: a ascensão do vice-presidente, que figurou como segundo escalão do esquema político mais corrupto da história, poderia reconcilia­r sociedade e políticos?

Só a renovação do quadro político vigente pode proporcion­ar um efetivo recomeço. Arranjos de gabinete, que a população detecta e repudia nas redes sociais, servem apenas para aprofundar o abismo entre o país real e o oficial.

Mudanças ministeria­is com o indisfarçá­vel objetivo de garantir foro privilegia­do a investigad­os não passam de tentativas de obstrução de Justiça, além de explícita confissão de crime. E o resultado é que aprofundam a rejeição popular à política, sem a qual, no entanto, não há democracia e paz social.

Não temo as urnas —e não temo o PT. Se ele conseguiu sobrevida desde o impeachmen­t, isso se deve exatamente à solução precária, pondo em cena um governo de suspeitos e investigad­os, a começar pelo presidente e seus principais ministros.

O governo Temer tem sido o oxigênio que mantém vivo o PT e lhe oferece chances de ressurgime­nto. Quanto mais tempo perdurar, mais chances de sobrevida dará a um projeto criminoso de poder, com o qual hoje se confunde.

Lula finge querer diretas. Sabe que não tem chances, mas percebe o temor dos adversário­s, que, por covardia, acabam por viabilizar sua narrativa de perseguido político. Temos então que a bandeira das diretas passou às mãos dos delinquent­es, enquanto os que defendem o saneamento moral contentam-se, inversamen­te, com truques que oscilam entre manter um presidente investigad­o ou sucedê-lo por via indireta.

Alegam que a Constituiç­ão não prevê diretas nessa circunstân­cia. Ora, nenhum legislador poderia prever o que aí está —a perda de credibilid­ade de toda a classe política. Nesses termos, não concebeu soluções à altura do necessário. Antecipar eleições, em diversas nações desenvolvi­das —e o Reino Unido acaba de fazê-lo, em face do “brexit”—, é recurso comum e legítimo.

A democracia é o regime da maioria, e, quando a crise a ameaça, o remédio é recorrer à fonte que a nutre: o povo.

O país carece de reformas urgentes, mas não será possível fazê-las sob um governo desacredit­ado. Não basta obter votos de um Congresso que padece dos mesmos males. Não se trata de questão contábil. A população rejeita o que daí advenha —e é dessa rejeição que se valem petistas e satélites para tentar reocupar as ruas, cuja hegemonia perderam.

Quanto mais esse governo perdurar, mais chances de sobrevida dará a um projeto criminoso de poder

RONALDO CAIADO,

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