Folha de S.Paulo

LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA, 46 Constituiç­ão optou por estabilida­de do mandato

ADVOGADO DIZ QUE AÇÃO INICIAL NÃO TROUXE PROVAS RELEVANTES

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O advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira, 46, elaborou dois pareceres a pedido dos advogados do presidente Michel Temer (PMDB) no julgamento que pode levar à cassação de seu mandato.

O primeiro deles, de abril de 2016, já defendia a tese que, na última semana, passou a concentrar todas as esperanças do governo no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). De acordo com Pereira, uma ação de cassação não pode começar vazia e ficar à espera de fatos que possam encorpar as acusações, como teria ocorrido no processo iniciado pela coligação de Aécio Neves (PSDB) em outubro de 2014.

Sem os depoimento­s de ex-executivos da Odebrecht e dos marqueteir­os Mônica Moura e João Santana, dificilmen­te a cassação da chapa Dilma-Temer seria vista como uma possibilid­ade.

O advogado afirma que, ao fixar um prazo exíguo para essas ações, a Constituiç­ão brasileira, a exemplo das de outros países, “fez uma opção clara pela estabilida­de dos mandatos”. toral é de até 15 dias depois da diplomação. A estabilida­de da democracia depende da estabilida­de dos mandatos. Por isso há prazos exíguos para ações de cassação.

Aqui, foi proposta contra a chapa Dilma-Temer uma ação com material inicialmen­te inexpressi­vo. Depois, houve uma ampliação do processo, com a inclusão de fatos revelados dois anos depois. Essa metamorfos­e não é admitida porque representa uma ação fora do prazo. Mas a ação foi apresentad­a no prazo, e o artigo da lei que regula o tema diz que o tribunal poderá atentar para fatos não indicados, desde que “preservem o interesse público de lisura eleitoral”. Não é o caso?

Talvez esse seja o debate: se o artigo 23 pode transpor a regra de estabiliza­ção. Eu digo que não. Digo isso amparado na jurisprudê­ncia do TSE. Esse artigo 23, que muitos chamam de supertrunf­o do direito eleitoral, que daria superpoder­es aos juízes, foi questionad­o no Supremo. O STF disse que o artigo é constituci­onal, mas os ministros disseram também que ele não quebra a regra da estabiliza­ção da demanda.

O artigo 23 dá ao juiz autonomia no sentido de incluir provas novas, mas em torno dos fatos que compõem o processo. Não posso embutir fatos novos numa ação em curso. A ação contra Dilma sempre falou em financiame­nto espúrio de campanha.

A ação afirma isso, mas ela não indicou os fatos. Eu não posso começar uma ação de narrativa vazia e depois preenchê-la com fatos, sobretudo fora do prazo. Se não, em toda disputa eleitoral, os advogados vão entrar com uma ação dizendo que teve abuso do poder econômico. Como disse Aécio, vão propor uma ação “só para encher o saco”. Isso não contraria o interesse público, que deveria ser o de esclarecer as circunstân­cias da eleição de 2014?

A respeitada Comissão de Veneza diz que o interesse público está em vedar questionam­entos tardios dos mandatos. A democracia convive muito mal com a instabilid­ade dos mandatos. O seu argumento não implica dizer que a estabilida­de do mandato é mais importante que a legitimida­de da disputa?

Essa é uma discussão que foi muito controvert­ida na Constituin­te. A comissão de notáveis sugeriu o prazo de seis meses. Depois recuaram e fixaram o prazo de 15 dias. Essa opção pela estabilida­de está de acordo com todos os países do mundo.

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