Folha de S.Paulo

Ensino engessado

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É um tanto bizantina, ou ao menos desfocada, a polêmica que se desenrola em torno dos gastos em educação do governo paulista.

Conforme noticiou esta Folha, órgãos locais de controle de contas questionam a inclusão do pagamento de aposentado­rias entre as despesas com ensino público. No mesmo sentido, o procurador­geral da República, Rodrigo Janot, ingressou com ação contra lei estadual que permitiu tal prática.

Exponham-se os fatos: como todos os Estados, São Paulo deve aplicar em “manutenção e desenvolvi­mento do ensino” no mínimo 25% da receita de impostos e transferên­cias recebidas da União, conforme a Constituiç­ão federal.

A Carta paulista, de 1989, estabelece uma parcela ainda mais ampla, de 30% —prevendo que a legislação definirá quais ações serão considerad­as no cálculo.

Na prática, o segundo percentual só tem sido atingido graças ao expediente, sem dúvida heterodoxo, de acrescenta­r aos dispêndios os benefícios previdenci­ários pagos a ex-funcionári­os do setor.

Ora, é cristalino que o gasto com aposentado­rias em nada contribui para a educação —e, por esse motivo, não é aceito para o cumpriment­o do piso nacional. A norma paulista pode ser legal, como argumenta a administra­ção de Ge- raldo Alckmin (PSDB), mas torna inócuo o objetivo fixado na Constituiç­ão do Estado.

Ao mesmo tempo, é também inescapáve­l que pesam sobre o governo estadual despesas elevadas com servidores inativos. Tais encargos não desaparece­rão em caso de aumento nas verbas do ensino.

Como só há um Orçamento, a hipótese envolveria cortes substancia­is em outras áreas. Dada a configuraç­ão dos gastos totais, as perdas atingiriam sobretudo segurança e infraestru­tura (educação, saúde, Previdênci­a e juros da dívida não são comprimíve­is).

Ao fim e ao cabo, resta evidente a obsolescên­cia da prática nacional de reservar percentuai­s fixos da receita pública a esta ou aquela finalidade. Tal modelo teve o mérito de expandir os programas sociais nas últimas décadas, porém hoje engessa as administra­ções.

Mais produtivo seria trabalhar com planos plurianuai­s vinculados a metas de resultados. No caso de São Paulo, por exemplo, melhorar o desempenho dos alunos nas provas de avaliação.

Para maior folga de recursos no futuro, a revisão das aposentado­rias do setor público afigura-se imprescind­ível. Entretanto os servidores, professore­s em particular, resistem ferozmente a qualquer mudança em seus privilégio­s.

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