Folha de S.Paulo

ANÁLISE Ao salvar o presidente Michel Temer, TSE serviu pizza requentada ao país

- BERNARDO MELLO FRANCO

O julgamento da chapa Dilma-Temer foi previsível até no placar. Com semanas de antecedênc­ia, o governo já projetava a vitória por 4 votos a 3. Ao confirmar o resultado, a corte assinou um recibo de submissão ao Planalto e serviu uma pizza requentada ao país.

O governo não teve dificuldad­e para tratorar o relatório de Herman Benjamin. Na reta final do processo, Michel Temernomeo­udoisdosse­te ministros que decidiriam seu futuro. Napoleão Maia era visto como o terceiro voto garantido pela absolvição.

Faltava apenas um ministro para liquidar a fatura. Para isso, Temer contava com o amigo Gilmar Mendes na cadeira de presidente do TSE.

Não houve suspense algum quando Rosa Weber votou a favor da cassação e deixou a tarefa do desempate para Gilmar.

Ele agiu como se esperava. Criticou o Ministério Público, repetiu que o TSE não poderia gerar “instabilid­ade política” e assegurou a permanênci­a de Temer no poder.

A surpresa ficou restrita ao repertório do ministro. Acostumado a citar juristas em alemão, ele recorreu a Américo Pisca-Pisca, o personagem de Monteiro Lobato, para justificar o voto a favor do governo. “Se eu fosse reformar a natureza, colocaria as abóboras nas jabuticabe­iras”, recitou.

Gilmar também encontrou tempo para rebater as críticas pela proximidad­e com o presidente. “Essa lógica de amigo e inimigo outros praticam, não eu”, informou.

Apesar da derrota, Herman deixou o plenário com a imagem de “campeão moral”. Num voto extenso, ele detalhou o uso de propina e caixa dois da campanha de 2014 e constrange­u os colegas que decidiram ignorar as provas da Lava Jato.

“Como juiz, recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não vou carregar o caixão”, avisou. Nem precisava. Já havia quatro ministros dispostos a segurar as alças do esquife. Como recuperar a confiança?

Estamos na dependênci­a de surgirem novas lideranças que restaurem princípios democrátic­os. Não apenas as pessoas não pedem desculpas, como não dão indicação de que vão mudar o comportame­nto e não sugerem novos nomes. Em alguma medida, isso é um indicador de que os partidos não são capazes de projetar novas gerações de líderes, preparar, qualificar… As portas estão fechadas. Nesse cenário, a opinião pública acaba criando heróis, como o juiz Sergio Moro?

Tem uma certa tradição no Brasil de personaliz­ar figuras do mundo político. Na ausência de partidos capazes de interpreta­r a crítica e dar uma resposta, está havendo uma tendência de refocar em pessoas que poderiam representa­r uma política alternativ­a. [O ex-ministro do STF] Joa- Como o senhor vê a possibilid­ade de eleições diretas?

Acho que não temos chance. Primeiro porque a Constituiç­ão não prevê e é importante cumpri-la. Nem a esquerda acredita que isso é possível, está defendendo mais para ter um elemento de mobilizaçã­o, o que acho ruim. Se tem uma bandeira que sabe que não dá para fazer, é uma fraude.

Estamos na dependênci­a de surgirem novas lideranças que restaurem princípios democrátic­os. Não apenas as pessoas não pedem desculpas, como não dão indicação de que vão mudar o comportame­nto e não sugerem novosnomes. Isso é um indicador de que os partidos não são capazes de projetar novas gerações de líderes

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