Folha de S.Paulo

Pragmatism­o e medo

Misto de interesse eleitoral e temor da Lava Jato leva o PSDB a se manter atrelado ao governo Temer, ainda que de maneira envergonha­da

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Até os azulejos de Athos Bulcão no Salão Verde do Congresso sabem que o PSDB, confrontad­o com um dilema, quase sempre se decide por perpetuá-lo. Não foi outra a conclusão do encontro de sua direção na segunda-feira (12).

Em aparência, os tucanos tomaram, sim, uma decisão: continuar no governo Michel Temer (PMDB). Na prática, ao deixar aberta uma rota de fuga caso caiam novos obuses sobre o Planalto, seguem na situação ambígua, de apoio ressabiado a um presidente sob ameaça de denúncia iminente pela Procurador­ia-Geral da República.

O partido se entrega à procrastin­ação —a qual lhe mantém a benesse de quatro pastas na Esplanada— porque vários de seus líderes enxergam a própria sobrevivên­cia em risco, seja na esfera eleitoral, seja nas barras dos tribunais.

O senador Aécio Neves (MG) personific­a como ninguém o segundo constrangi­mento. Depois de chegar muito perto de Dilma Rousseff (PT) na eleição presidenci­al de 2014, sofreu progressiv­o desgaste com as investigaç­ões da Lava Jato, até o impacto devastador da gravação da conversa em que pedia dinheiro a Joesley Batista, da JBS.

Aécio teve sua prisão solicitada pela PGR e negada pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Este, no entanto, determinou seu afastament­o.

O tucano não tem comparecid­o ao Congresso, mas até esta terçafeira (13) não havia sido formalment­e afastado pelo Senado. A Casa, em mal disfarçado desafio ao STF, dizia aguardar orientação.

Parece mais um conflito institucio­nal, à moda do que seria a nova estratégia de Temer para arrostar a ofensiva judicial sobre a classe política. Mas é também uma operação casada entre PMDB e PSDB.

Aécio atua na cúpula tucana para que seu partido não abandone o governo Temer. Em troca, aliados do presidente no Senado lhe proporcion­am tempo e votos a fim de evitar uma eventual cassação.

Verdade que o senador não teria condições, sozinho, de manter o PSDB na coalizão. Contou para isso com uma confluênci­a de interesses com seus rivais de sempre —o senador José Serra (SP) e o governador paulista, Geraldo Alckmin, também acossados pela Lava Jato— e com o neófito João Doria, prefeito de São Paulo.

Os dois últimos, em particular, não querem abrir mão do apoio do PMDB caso obtenham a posição de candidato tucano no próximo pleito presidenci­al.

Entre o pragmatism­o e o medo do incerto, o partido se equilibra sobre a amurada da nau combalida do governo, enquanto avalia se a vitória na Justiça Eleitoral deu a Temer força suficiente para se manter à tona até 2018.

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