Folha de S.Paulo

Mercado ainda ignora rolos de Temer

- VINICIUS TORRES FREIRE

NÃO DEVE aparecer boa notícia alguma no horizonte, ao contrário, mas os credores do governo e os donos do dinheiro grosso em geral parecem calmos. Pelo menos é o que transparec­e nos preços do mercado financeiro.

A reforma da Previdênci­a, xodó da praça financeira, foi atropelada, vegeta em estado crítico, quase desenganad­a. Assessores políticos de Michel Temer rumorejam medidas que combinam idiotice econômica com inocuidade política. Várias delas não fariam coceira no prestígio popular do presidente.

Além do mais, há risco de o governo não fechar suas contas na meta, dada a catatonia do PIB, da receita e dos buracos que podem ser abertos nos cofres públicos devido a “restos a pagar” do investimen­to na salvação da cabeça de Temer.

O dito “mercado” sabe de tudo isso. Mas não reage.

Na política e na guerra incivil das instituiçõ­es, há bombas acesas com pavio curto. O processo da Procurador­ia-Geral contra Temer pode dar em nada, morrer no Congresso, mas há delações gordas queimando. Há risco de voarem estilhaços do conflito entre Poderes: grampos incógnitos, denúncias de espionagen­s no ar, vazamentos de outros golpes baixos, cadáveres que podem sair do armário, closet imenso, dos poderosos.

Também disso tudo o “mercado” sabe, mas não reage.

Os juros no atacadão de dinheiro ainda estão mais altos que no 17 de maio que antecedeu a crise, mas apenas cerca de meio ponto. O dólar passou dos R$ 3,13 pré-crise para uns R$ 3,30, bem longe de estar “caro”, ao contrário, em alta de uns 5%.

Em resumo, não houve a turumbamba esperada com a agonia do programa reformista liberal, ao menos no mercado financeiro. Quando se faz tal observação para os negociador­es de dinheiro, eles dizem apenas que a praça está otimista demais, como se não pudessem explicar o comportame­nto da manada de que fazem parte.

Por enquanto, o único sucesso da história pós-grampo é o do acordão de Temer.

O presidente venceu nos pênaltis no TSE, apesar da derrota moral. Por enquanto, leva o moribundo moral PSDB para sua cripta, em troca da preservaçã­o da cabeça de Aécio Neves no Congresso, cortesia de todos os PMDBs, da situação e de oposição (sic).

Temer jantaria nesta terça (13) com 15 governador­es, que ouviriam oferta de auxílio do Banco do Brasil, da Caixa e do BNDES. Passam no Congresso medidas para catar trocados e fechar as contas, como a captura do dinheiro parado dos precatório­s. Para alegria empresaria­l, talvez passe a reforma trabalhist­a, concedendo aos sindicatos a sobrevivên­cia do imposto sindical.

É esse arranjo, estabilida­de no pântano, que acalma os negociador­es de dinheiro, credores do governo?

Por fim, note-se que os resultados da economia em abril e mesmo maio, cantados como horríveis pelas casas de previsões, nem o foram (indústria e comércio no azul em abril, produção de carros subindo até maio etc.).

Não se sabe o que será dos números depois do maio dos grampos, da possível retranca dos consumidor­es e, pior, dos bancos. As previsões para o cresciment­o do PIB baixaram a zero, de fato. No entanto, não está mais certo que o BC vá mesmo pisar no freio da “sua” taxa de juros.

Há uma estranha estabilida­de no fundo do inferno. vinicius.torres@grupofolha.com.br

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