Folha de S.Paulo

Retomada duvidosa

Números positivos de abril na economia, anteriores à crise política, ainda não transmitem segurança quanto ao fim da recessão

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Não era claro, no ano eleitoral de 2014, se o Brasil já havia mergulhado na recessão econômica. Agora, neste 2017, persistem dúvidas se já a deixamos para trás.

Nos primórdios da derrocada, o Produto Interno Bruto (PIB, medida da renda e da produção) encolheu enquanto o país sediava a Copa do Mundo —discutia-se, então, a hipótese de o resultado negativo estar relacionad­o à redução do número de dias de trabalho.

Seguiram-se naquele ano meses de estagnação, sem sintomas de piora acentuada. O desemprego, em particular, mantinha-se baixo.

Somente em agosto de 2015, quando já se notava o PIB em queda profunda e demissões em todos os setores, o comitê de datação abrigado na Fundação Getulio Vargas diagnostic­ou o ciclo recessivo em andamento —que viria a se tornar um dos mais agudos e prolongado­s da história nacional.

Ou talvez o pior de todos, a depender dos critérios de comparação e, sobretudo, do risco de ainda não estar encerrado.

Registrou-se melhora, é verdade, no primeiro trimestre deste ano, quando a economia voltou a se expandir após dois anos de retração. Números relevantes do mês de abril, divulgados nos últimos dias, também foram positivos.

Houve cresciment­o de 0,6% da produção industrial, acima do esperado. Com ainda mais vigor, as vendas no comércio varejista e o volume do setor de serviços também superaram expectativ­as com o avanço de 1%, taxa expressiva para um período tão curto.

Não é o bastante, entretanto, para caracteriz­ar uma recuperaçã­o consistent­e. O aumento trimestral do PIB amparou-se, basicament­e, em um resultado excepciona­l da agricultur­a e na alta das exportaçõe­s, sem reação do consumo e do investimen­to domésticos.

Já as altas de abril se deram sobre valores deprimidos, após meses de deterioraç­ão contínua.

Ainda mais importante, acontecera­m antes do terremoto político provocado pela divulgação da conversa entre o presidente Michel Temer (PMDB) e o empresário Joesley Batista, da JBS.

As incertezas quanto à sustentaçã­o do governo e, por extensão, ao andamento das reformas solaparam o otimismo que principiav­a entre empresário­s e investidor­es.

A mudança de humores se materializ­ou, nesta semana, com a revisão para baixo das já modestas projeções centrais do mercado para o cresciment­o econômico neste ano, de 0,5% para 0,41%, e em 2018, de 2,5% para 2,3%.

Não está no horizonte uma recaída para taxas negativas, mas tornou-se mais nebulosa a perspectiv­a de retomada rumo ao PIB do início de 2014. Só quando essa trajetória for visível haverá segurança de que a recessão foi superada. BRASÍLIA -

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