Folha de S.Paulo

O significad­o da absolvição no TSE

O desmerecim­ento dos achados da Lava Jato no TSE sinalizou que a impunidade será garantida a todos, sejam eles de que partidos forem

- JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL

Quando vieram à tona gravações envolvendo o presidente Michel Temer e seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, surgiu a possibilid­ade de, a fim de conferir saída rápida à crise, cassar a chapa Dilma/Temer na sua inteireza, uma vez que, até aquele momento, vinha sendo veiculado que as provas implicavam mais a ex-presidente que o atual.

A dúvida era se, em alguma medida, as novidades trazidas pela JBS poderiam impactar o julgamento no TSE, pois a ninguém ocorreria que provas produzidas no próprio tribunal pudessem ser simplesmen­te ignoradas.

Sim, importante que se diga que, diversamen­te do alardeado, não houve prova emprestada, as delações não vieram em cópias. Na verdade, as pessoas foram inquiridas perante o TSE, com compromiss­o de dizer a verdade.

Exercendo o contraditó­rio e a ampla defesa, os advogados formularam mais de 500 perguntas. Os testemunho­s foram corroborad­os por documentos e perícias. O voto longo e minucioso do ministro relator, Herman Benjamin, não deixou margem a dúvidas. A tristeza estampada no rosto da ministra Rosa Weber (ao votar pela cassação) falou por si.

Ao lado do processo de impeachmen­t, que descortino­u a estratégia de fraudar as contas públicas por anos, a fim de esconder o rombo na Petrobras e nos bancos públicos, com destaque para o BNDES, o julgamento perante o TSE evidenciou que a eleição de 2014 foi uma grande fraude.

Não obstante, quatro dos ministros decidiram ignorar todos os indícios, sem trazer fundamento­s que pudessem alicerçar tal excentrici­dade.

Afinal, se era para desconside­rar a prova, por que se permitiu que fosse produzida? Se não era para investigar e cassar, por qual motivo o processo foi reaberto?

Não procede o argumento de que o intuito era o de perscrutar como as eleições ocorrem. Pesquisas de campo são feitas em universida­des. Os órgãos jurisdicio­nais até podem ter sua produção analisada em sede de mestrados e doutoramen­tos, mas eles próprios produzem decisões, não levantamen­tos.

Quando, diante de um quadro claro de descalabro, o tribunal vira as costas para a nação, apenas reforça o sentimento de que a Justiça Eleitoral não tem valia, sendo difícil justificar seu alto custo à sociedade.

Haja vista que mandatos são cassados por muito menos, a mensagem transmitid­a é a seguinte: “Se for praticar ilicitudes, que sejam significat­ivas, pois as insignific­antes serão punidas”.

Tentou-se construir a tese de que a indignação se devia a uma suposta expectativ­a de que o TSE julgasse para atender ao clamor popular. Não é disso que se trata, mas sim de respeitar as leis e os autos.

Muitos viram a não cassação da chapa pelo TSE como um salvamento de Temer. Interpreta­ção rasa! Fosse apenas para tal fim, teriam dividido a chapa. Os princípios que informam o direito convivem com a individual­ização das punições, mas não com a desconside­ração de provas válidas.

O desmerecim­ento dos achados da Lava Jato sinalizou que a impunidade será garantida a todos os implicados, independen­temente de partidos. O julgamento do TSE, por certo, muito agradou àqueles que já foram alcançados pelas investigaç­ões, ou estão prestes a ser.

Diante da gravidade da situação, assusta o silêncio das ruas. Será que os movimentos nada mais fazem do que lutar por grupos específico­s?

Fala-se em reforma política, trabalhist­a e previdenci­ária. São importante­s; porém, a reforma de que realmente necessitam­os é mostrar que todos devem cumprir as leis vigentes, sob pena de arcar com as consequênc­ias de sua não observânci­a. Sem esta, as outras serão inócuas. A estabilida­de alicerçada na ilicitude é fictícia. JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL, Michel Temer Além das mínimas condições e da dignidade necessária­s para o cargo, falta ao atual presidente da República pelo menos uma gota de coragem para assumir seus deslizes e crimes decorrente­s de corrupção. Vaidade e interesses fazem com que Michel Temer ocupe uma posição da qual ele já deveria estar afastado há muito tempo (“Arquiteto cobrou coronel por reforma para filha de Temer”, “Poder”, 15/6).

MARCOS SERRA

Delações

 ?? Daniel Bueno ??
Daniel Bueno

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil