Folha de S.Paulo

Cadê nosso futuro?

- PEDRO LUIZ PASSOS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo:

DE PAÍS do futuro a país outra vez desarvorad­o quando a economia parecia parar de piorar, as únicas certezas são de que a regressão continua a passos firmes e a saída da crise, que já seria difícil e arrastada sem nenhum novo escândalo, se distancia cada vez mais.

As denúncias se acumulam, e não há surpresa diante de um sistema político em que o governante de turno forma maioria parlamenta­r mediante o loteamento da gestão pública entre partidos com os quais não tem a mais remota afinidade programáti­ca e se compensa carências e lacunas da economia subsidiand­o a atividade privada em vez de corrigi-las.

A agenda de reformas, parte aprovada no Congresso, como a revisão de regulações anacrônica­s, entre elas, as regras de conteúdo nacional e o teto do gasto público, além das reformas da Previdênci­a e da CLT, que vem, ou vinha, tramitando até com celeridade, já não é mais tão segura. Sem elas, os agouros para o Brasil são inquietant­es, medonhos, pode-se dizer.

O empresário é otimista de ofício, e reconheço que as condições estruturai­s do Brasil são ímpares e até superiores às das novas potências que despontam nos rankings de expansão econômica, redução da pobreza e desenvolvi­mento tecnológic­o, como China e Índia.

Mas é preciso reconhecer que a crise política seriada nos afastou mais uma vez do que vinha razoavelme­nte em evolução, mesmo consideran­do algo reducionis­ta achar que com duas a três reformas tudo se resolve. Nossos descompass­os estão em toda parte, e não só na economia, como revelam as estatístic­as sobre os assassinat­os no país (60 mil por ano!), sobretudo da população mais jovem. Atrasos na educação, na saúde e na tecnologia não são menos gritantes.

O tamanho da encrenca é enorme. É como se estivéssem­os nos afastando não só do desenvolvi­mento, mas da civilizaçã­o e do mundo em transforma­ção tecnológic­a aguda, condenados à mediocrida­de pela falta de conscienti­zação da sociedade sobre o que se faz necessário e de lideranças capazes de convencê-la.

Tome-se a Previdênci­a. Sua reforma não é contingent­e, mas crucial, num mundo em que, segundo estudo do World Economic Forum, metade dos jovens nascidos em 2007, ao menos na porção mais rica, já tem a expectativ­a de viver até 2110, 103 anos em média!

Não há dinheiro para prover aposentado­ria a tanta gente. O estudo estima um furo de US$ 400 trilhões de poupança adicional para tais aposentado­rias até 2050, o triplo do PIB global. Isso só em oito países pesquisado­s (EUA, China, Índia, Japão, Reino Unido, Canadá, Austrália e Holanda). Por tamanho do PIB, população e demografia, o Brasil está no mesmo cenário, que será pior se não enfrentado.

Mas o nível dos debates é pífio, estamos todos ligados na próxima denúncia, olhando se Temer fica ou sai. Não há formulação para os desafios que já se colocam quanto mais para os que se avistam. Ao contrário: a agenda sofre interdiçõe­s políticas, enquanto o país anda para trás nas principais dimensões.

Em 1980, nosso PIB equivalia a 28% do dos EUA e era 26% maior que o da Coreia do Sul, segundo dados do economista Armando Castelar. Já em 2020, diz o FMI, nosso PIB per capita será menos de 20% do dos EUA e 36% do coreano. E vai agravar-se, com o PIB acumulando retração de 7,5% no ultimo biênio e tendendo à estagnação neste ano. A renda per capita murchou 9,2% em dois anos. Como virar esse jogo?

O que está à frente é uma tarefa altamente complexa e muito pouco percebida pelas lideranças políticas e empresaria­is. Sempre é possível contar com o imponderáv­el. Por ora, à luz do que sabemos, é mais prudente apertar o cinto porque a crise vai demorar. PEDRO LUIZ PASSOS,

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