Folha de S.Paulo

Cientistas investigam por que ave de Galápagos deixou de voar

Estudo descobriu base genética para fenômeno visto por Darwin

- RICARDO BONALUME NETO

Um dos vários mistérios naturais que despertara­m a curiosidad­e do naturalist­a britânico Charles Robert Darwin (1809-1882) e o estimulara­m a propor uma teoria para a evolução biológica teve suas bases moleculare­s decifradas.

Um estudo publicado na revista “Science” revelou que uma série de genes pode estar envolvida na perda da capacidade de voar de uma ave aquática, o cormorão das ilhas Galápagos. E, surpreende­ntemente, os genes que estariam por trás das asas atrofiadas são semelhante­s àqueles associados a problemas ósseos em seres humanos.

Algumas aves voam e outras não, como avestruzes, galinhas e emas, mas o caso do cormorão é ainda mais curioso, já que, das cerca de 40 espécies dessas aves, apenas uma não consegue voar — aquela que Darwin encontrou nas Galápagos (nome científico Phalacroco­rax harrisi).

A evolução da perda de voo é uma das modificaçõ­es de membros mais recorrente­s na natureza. Para Darwin, seria mais um argumento em prol da sua teoria da evolução através da seleção natural.

Pode-se definir a seleção natural como o processo na natureza pelo qual os organismos melhor adaptados ao seu ambiente tendem a sobreviver e a transmitir suas caracterís­ticas genéticas. Ou, como diz a versão pop, “a sobrevivên­cia dos mais aptos”.

O isolamento geográfico deste arquipélag­o no oceano Pacífico pertencent­e ao Equador contribuiu para que não houvesse nenhum grande predador terrestre, como os leões africanos. O topo da cadeia alimentar é constituíd­o por aves de rapina, um tipo de gavião e um de coruja.

Ou seja, não há predadores que demandaria­m que os cormorões mantivesse­m a capacidade de voo. Para Darwin, isso seria tanto resultado da “seleção natural positiva” para corpos maiores ou de uma seleção mais relaxada devido à ausência de predadores.

O que a equipe de Alejandro Burga e Leonid Kruglyak da Universida­de da Califórnia em Los Angeles (oeste dos EUA) fez foi comparar os genomas do cormorão de Galápagos e de outras três espécies de cormorões.

Na ave das Galápagos, mas não nas outras três, foi achado um grande enriquecim­ento de genes associados a distúrbios do desenvolvi­mento humano, notadament­e os que afetam o desenvolvi­mento dos membros.

“Darwin, apenas examinando essas mudanças, inferiu o processo de evolução por seleção natural. Agora, temos ferramenta­s genéticas sofisticad­as para reexaminar esses exemplos clássicos e descobrir o que aconteceu no nível molecular”, disse Kruglyak.

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Caroline Duffie Judy Há cerca de 40 espécies de cormorão, mas somente a das Galápagos não consegue voar

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