Folha de S.Paulo

Impunidade mineira

Com só um condenado após quase uma década desde a denúncia formal, mensalão tucano mostra que celeridade da Lava Jato ainda é exceção

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Já pertencem ao folclore político nacional as notícias —melhor dizendo, a falta delas— sobre o andamento judicial do chamado mensalão mineiro, formalment­e denunciado quase uma década atrás.

Como no caso petista, o mensalão tucano envolveu a participaç­ão do empresário Marcos Valério de Souza, a quem se atribui a arquitetur­a de um esquema destinado a desviar recursos de empresas públicas para o financiame­nto de campanhas eleitorais.

Em Minas, estatais estariam na origem de recursos que, passando pelo célebre Banco Rural —também utilizado no esquema do PT— terminavam alimentand­o a agência publicitár­ia de Marcos Valério, a qual se dedicava à campanha do então governador do Estado, Eduardo Azeredo (PSDB), candidato à reeleição em 1998.

Condenado, em dezembro de 2015, a 20 anos de prisão —foi o único, em todo o escândalo, a conhecer alguma sentença até agora—, Azeredo continua em liberdade, na dependênci­a de uma confirmaçã­o em segunda instância. Não há data para o julgamento.

Outros envolvidos beneficiam­se da prescrição. Como não é incomum em processos desse tipo, o mensalão mineiro seguiu um complexo percurso entre o Supremo Tribunal Federal, o juízo de primeira instância e o Tribunal de Justiça estadual, conforme seus personagen­s assumiam ou deixavam cargos com foro privilegia­do.

Na Justiça mineira, o caso desmembrou-se em seis processos, dois deles ainda na fase preliminar em que se coletam testemunho­s.

Embora extremo, o exemplo de impunidade que se obtém com esse episódio não constitui exceção, sem dúvida, ao se analisar o quadro geral do país antes do mensalão petista e da Lava Jato.

Tudo parece agravar-se, contudo, quando se levam em conta notícias sobre supostas omissões do Ministério Público em Minas. Inspeção recente, realizada pela Corregedor­ia Nacional do MP, menciona irregulari­dades de monta.

Um processo apontando propaganda irregular, quando prefeito, por parte do hoje governador Fernando Pimentel (PT) teria passado cinco anos dentro de um armário. Autoridade­s eram avisadas com antecedênc­ia das denúncias de que eram objeto.

Um promotor considerad­o incômodo para políticos teria sofrido represália­s, enquanto outros, suspeitos de crimes, passaram apenas por audiências internas.

Acrescente-se que dificilmen­te haverão de limitar-se a Minas Gerais problemas desse tipo. No combate à corrupção, não há dúvidas de que a Lava Jato ainda espera sua plena tradução nas diversas administra­ções estaduais. SÃO PAULO - BRASÍLIA -

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