Folha de S.Paulo

Companhias investem em formação

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Quando Levi Hall viu o anúncio para um programa de treinament­o de 12 semanas que oferecia um estipêndio a estudantes dotados apenas de diplomas de ensino médio e ajuda para colocá-los em bons empregos de período integral no fim do curso, ele achou que fosse uma pegadinha.

“Eles vão treiná-lo, pagar um salário, credenciá-lo e ajudá-lo a encontrar emprego? Achei que isso com certeza fosse bom demais para ser verdade”, diz Hall, 25, que estava trabalhand­o em um escritório e ganhando salário mínimo, quando se inscreveu para o curso, na Flórida.

Diversos outros jovens participan­tes e formandos do programa, operado pela consultori­a McKinsey, riram como se entendesse­m perfeitame­nte bem o que ele falou. Como Hall, todos tinham diplomas de ensino médio.

No entanto, como quase um sexto dos trabalhado­res norte-americanos, todos eles enfrentava­m problemas.

Alguns não tinham dinheiro para fazer um curso superior, e outros não tinham como se manter na faculdade por quatro anos; e alguns fizeram cursos secundário­s que não propiciara­m qualquer treinament­o aproveitáv­el para o trabalho.

Porém, como participan­tes do programa “Generation”, da McKinsey, todos têm empregos de período integral.

“Eu gostaria de ter feito o ensino médio em uma escola que me ensinasse capacitaçõ­es reais, que me valessem emprego”, disse Hall, que conquistou um certificad­o de programaçã­o de computador­es que o qualificou para um emprego de salário mais alto no departamen­to de informátic­a de uma grande empresa.

“Mas esse tipo de escola nem existe mais. Senti que o curso era minha última chance de me tornar empregável”.

Esse cenário diz muito sobre o estado disfuncion­al do mercado de trabalho.

Há anos nota-se um aumento no descompass­o entre as capacitaçõ­es de que as empresas necessitam e as capacitaçõ­es que os trabalhado­res têm e os educadores ensinam.

Isso é verdade no mundo todo —40% dos clientes da McKinsey dizem que esse descompass­o é um motivo importante para que não consigam preencher vagas em aberto.

Pesquisado­res da Universida­de Harvard atribuíram até um terço das perdas de emprego nos EUA no período da grande recessão não à falta de demanda, mas sim ao descompass­o na capacitaçã­o.

Empresário­s se queixam da falta de conhecimen­tos técnicos dos candidatos a postos de trabalho de escalão médio, porque muitos dos universitá­rios se formam com diplomas inúteis —ao menos em termos de empregabil­idade.

E ainda assim restam 6 milhões de postos vagos. Para obtê-los, a maioria dos trabalhado­res requer qualificaç­ões intermediá­rias entre um diploma de ensino médio e um dispendios­o curso universitá­rio de quatro anos de duração.

Nos dez anos que se encerrarão em 2020, o número de postos de trabalho criados nos EUA será de 55 milhões, e 65% desses empregos exigirão alguma educação pósensino médio, segundo a Universida­de Georgetown.

Mas a maioria das categorias de empregos em mais rápido cresciment­o estará no mercado “subunivers­itário”, e diplomas não são essenciais para esses postos. PAULO MIGLIACCI

DO “FINANCIAL TIMES”

Desde os anos 60, a educação vocacional é vista nos Estados Unidos como uma área de escape para os estudantes menos afortunado­s.

Mas, se antes o ímpeto vinha dos sindicatos, agora vem dos empregador­es. Metade das 20 maiores empresas dos Estados Unidos opera programas de treinament­o de algum tipo, entre as quais grandes empresas de tecnologia como a Amazon e a Microsoft.

Os empregador­es compreende­ram que esse tipo de treinament­o é necessário não só para criar uma força de trabalho do século 21.

Ele também pode reduzir significat­ivamente o giro de mão de obra e o custo de recrutamen­to, que pode atingir milhares de dólares por vaga.

Numerosos esforços do setor privado respondem pela maior parte dos US$ 30 bilhões anuais gastos nesse mercado.

Há programas pequenos e sofisticad­os como o de formação de técnicos em turbinas a gás da Siemens, na Carolina do Norte, que busca alunos de colégios locais para empregos industriai­s, a um custo de US$ 175 mil anuais em um programa com duração de três anos. Parcerias entre o setor privado e o público, como as escolas Pathways in Technology, da IBM, buscam reinventar o ensino médio e superior.

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