Folha de S.Paulo

Salvando as delações

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SÃO PAULO - Fez muito bem o Supremo em manter as vantagens oferecidas aos irmãos Batistas e à JBS em sua delação premiada.

Eu estou entre aqueles que julgaram exagerados os benefícios que o Ministério Público (MP) concedeu aos colaborado­res. Ficou barato demais para os empresário­s. Eles próprios reconhecer­am que, ao longo de oito anos, compraram a boa vontade de quase dois milhares de políticos, em esquemas delituosos que somaram meio bilhão de reais, mas não passarão um único dia na cadeia e, se quiserem, poderão continuar à frente dos negócios da holding. Se isso não configura um caso de crime que compensa, precisamos redefinir as noções de crime e compensaçã­o.

Ainda assim, teria sido muito pior rever agora os termos da delação para aumentar as punições impostas aos Batistas. Se o tivesse feito, o STF não apenas teria escancarad­o as portas para rever todos os acordos de colaboraçã­o até aqui firmados no âmbito da Lava Jato —o que poderia ter impactos negativos sobre a operação— como também teria colocado em risco o próprio instituto da delação premiada, que já se mostrou valiosíssi­mo para um combate eficaz à corrupção e ao crime organizado.

O Estado precisa ter palavra. Não dá para o Estado na figura do MP prometer uma coisa ao delator e, em seguida, o mesmo Estado, agora na “persona” do STF, dizer que não gostou dos termos e desfazer tudo. O MP é o titular da ação penal e é a ele que cabe conduzir a negociação. O STF deve fazer um controle mais formal sobre a legalidade dessa transação penal, mas, a meu ver, não lhe cabe avaliar o mérito do que foi acertado.

A delação premiada é relativame­nte nova no direito brasileiro e ainda vai levar um certo tempo até que aprendamos a lidar com ela. Penso que devemos balizar melhor até onde os procurador­es podem ir em suas promessas, mas isso precisa ser feito por meio de lei e não de reações emocionais a casos concretos. helio@uol.com.br

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