Folha de S.Paulo

Equilíbrio fiscal e tamanho do Estado

- NELSON BARBOSA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank;

HOJE ADOTAREI um hábito de economista e assumirei que haverá solução para a atual crise política. Sei que isso é querer demais, mas tomo esse atalho para discutir dois temas inevitávei­s para qualquer governo, seja agora ou em 2019: qual deve ser a estratégia fiscal e o tamanho do Estado na economia?

Para responder a essa pergunta, é preciso separar as duas coisas, porque equilíbrio fiscal é compatível com diferentes tamanhos de Estado.

Nós, economista­s, definimos equilíbrio fiscal como uma relação estável entre dívida pública e renda total (PIB) da economia.

A partir de um valor ou meta para o grau de endividame­nto do governo, é possível calcular o resultado primário necessário para manter a relação dívida pública/ PIB constante com base em projeções para o cresciment­o, a inflação e a taxa de juro da economia.

No caso do Brasil, as projeções de médio prazo indicam ser necessário um resultado primário de 2% a 3% do PIB para manter a dívida líquida do setor público estável em 50% do PIB. Sejamos conservado­res e fiquemos com o maior valor. Nesse caso, qual é o tamanho do Estado necessário para obter um superavit primário de 3% do PIB?

A resposta depende da carga tributária que a sociedade está disposta a pagar pelos serviços fornecidos pelo Estado. Um superavit primário de 3% do PIB pode ser obtido, por exemplo, com uma receita de 23% do PIB e uma despesa de 20% do PIB. Mas um governo que arrecada 33% do PIB e gasta 30% do PIB em seu orçamento primário também pode chegar ao mesmo objetivo.

A estabilida­de fiscal está garantida nos dois casos, mas o tamanho do Estado e seu impacto sobre a vida dos cidadãos são bem diferentes.

Segundo a visão predominan­te entre economista­s, quanto maior o Estado, menor é o cresciment­o da economia, pois tributos e transferên­cias excessivas diminuem os incentivos ao trabalho e ao investimen­to, o que reduz a produtivid­ade. Essa visão é equivocada, pois a resposta da economia depende do tamanho inicial do Estado e da composição de suas receitas e despesas.

Em seu livro “Growing Public”, o economista Peter Lindert, da Universida­de da Califórnia em Davis, sustenta que não existe uma correlação negativa entre aumento do gasto social e cresciment­o da economia dentro dos limites observados nos países da OCDE. Em outras palavras, o aumento das despesas públicas com educação, saúde, Previdênci­a e assistênci­a social observado nos países avançados não compromete­u o aumento da renda per capita, desde que compatível com o equilíbrio fiscal.

Voltando ao Brasil, as conclusões de Lindert confirmam que, sim, devemos elevar nosso resultado primário para estabiliza­r o endividame­nto público, mas isso não requer necessaria­mente o Estado mínimo como defende a equipe econômica dos sonhos ... do mercado. Também é possível fazer isso com elevação da tributação sobre os mais ricos e realocação da despesa primária para programas de maior impacto positivo sobre o dia a dia da população, como saúde, educação infantil e infraestru­tura urbana.

O tamanho do Estado é uma decisão política sobre quais serviços a sociedade quer do governo, sobre quanto o governo deve diminuir a desigualda­de da distribuiç­ão de renda e sobre quem deve financiar essas duas ações. O Brasil de hoje precisa de um Estado melhor, não necessaria­mente de um Estado menor.

O Brasil de hoje precisa de um Estado melhor, não necessaria­mente de um Estado menor

NELSON BARBOSA,

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