Folha de S.Paulo

NA VERTICAL

- SÉRGIO ALPENDRE

COLABORAÇíO PARA A FOLHA

Léo (Damien Bonnard) é um cineasta que procura inspiração para seu filme. Primeiro ele encontra um belo jovem, Yoan (Basile Meilleurat), e oferece, sem obter resposta positiva, um papel para ele.

Depois encontra Marie (India Hair), uma fazendeira às voltas com lobos ameaçadore­s para seu rebanho. Marie também cuida do pai e dos dois filhos pequenos. Léo e Marie iniciam um romance.

Juntos eles têm um filho. Cansada de cuidar do filho sozinha quando Léo desaparece para escrever um roteiro, Marie resolve ir embora, deixando Léo, um irresponsá­vel de marca maior, criar o bebê por conta própria.

Essa é a trama de “Na Vertical”, quinto longa-metragem de Alain Guiraudie. Ela se desenvolve­rá de maneira imprevisív­el, como é hábito no cinema desse diretor.

Como em seu longa anterior, “Um Estranho no Lago”, há frontalida­de na representa­ção do corpo humano e do sexo: Guiraudie insiste num plano frontal de nu feminino deitado na cama, como se procurasse reproduzir “A Origem do Mundo”, famoso quadro de Gustave Courbet.

E, de fato, logo depois há o parto do bebê, filmado de perto, a desencoraj­ar olhares pouco afeitos à verdade nua e crua da anatomia humana. É uma imagem forte, que pode impression­ar e até assustar.

Há ainda um louvor à liberdade e à diversidad­e sexual. A bissexuali­dade é naturaliza­da, nunca usada como bandeira ou motivo de choque fácil em plateias conservado­ras.

Mas “Na Vertical” tem uma irregulari­dade que outros filmes de Guiraudie não têm. Em determinad­o momento, nos perguntamo­s o porquê de estarmos vendo um personagem tão desinteres­sante como esse protagonis­ta.

Aliás, os personagen­s mais interessan­tes são os velhos (como em “O Rei da Fuga”, de 2009): Jean-Louis (Raphaël Thiéry), o pai de Marie, que à certa altura mostra desejo sexual por Léo, e Marcel, senhor roqueiro que emprega Yoan como ajudante e amante.

A coragem para abordar frontalmen­te uma certa aspereza da França profunda e um final para lá de instigante, que explicita a razão de ser do filme (justamente encarar a vida de modo frontal), salvam Guiraudie do primeiro deslize de sua carreira. (RESTER VERTICAL) DIREÇÃO Alain Guiraudie ELENCO Damien Bonnard, India Hair, Raphaël Thiéry PRODUÇÃO França, 2016, 18 anos AVALIAÇÃO bom

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