Folha de S.Paulo

Anvisa esquálida

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Ao sancionar o texto que libera para venda no país três medicament­os anorexígen­os (emagrecedo­res), o presidente interino, Rodrigo Maia (DEM), arrancou mais um naco da autoridade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

O caso diz respeito às substância­s anfepramon­a, fempropore­x e mazindol. Esses inibidores de apetite derivados de anfetamina­s haviam sido proibidos pela Anvisa em 2011, sob a justificat­iva de que a perda de peso por eles induzida era pouco representa­tiva — além de difícil de manter após interrupçã­o do tratamento— e de que efeitos colaterais eram excessivos.

Apenas a anfepramon­a é vendida nos Estados Unidos, mas está proibida na Europa. O mazindol foi suspenso nos EUA e na Europa em 1999. O fempropore­x jamais foi autorizado nos EUA e terminou banido na Europa em 1999.

Ao que parece, os parlamenta­res brasileiro­s se consideram mais esclarecid­os do que os técnicos das agências reguladora­s da União Europeia, dos Estados Unidos e de seu próprio país.

Ou, então, dão menos ouvidos a eles do que a proprietár­ios de clínicas de emagrecime­nto, que pressionam para manter mais opções à mão, sem maior preocupaçã­o com a saúde de seus pacientes.

Conforme noticiou esta Folha, Rodrigo Maia —presidente da Câmara dos Deputados, ocupando o Planalto em razão de viagem de Michel Temer (PMDB)— consultou entidades médicas a respeito do assunto, tendo obtido opiniões favoráveis à sanção do diploma.

“Entendo o drama de milhares de brasileiro­s que têm níveis perigosos de obesidade e precisam ser levados a sério, e com responsabi­lidade, tendo acesso a um tratamento médico controlado”, escreveu.

Como em qualquer tema mais complexo, haverá divergênci­as entre especialis­tas. Mas, para além dessa medida particular, está em jogo a confiança num órgão público encarregad­o de algo fundamenta­l, a segurança farmacológ­ica da população.

A Anvisa, por certo, não dá exemplos de eficiência. Encarregad­a de expedir as licenças para a comerciali­zação de remédios no país, a agência por vezes leva anos na análise dos processos, para prejuízo dos consumidor­es doentes.

Para agravar o quadro, não raro o Executivo compõe sua diretoria com indicações políticas, outra irresponsa­bilidade.

Ao presidente da República, interino ou não, cabe restabelec­er a autoridade da agência, e não contribuir para erodi-la ainda mais.

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