Folha de S.Paulo

Cada macaco no seu galho

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SÃO PAULO - Depois da pílula do câncer, parlamenta­res resolveram mais uma vez fazer um “bypass” da Anvisa. O Congresso aprovou e a Presidênci­a sancionou uma lei que autoriza a produção, a comerciali­zação e o consumo de alguns medicament­os emagrecedo­res que foram banidos pela agência sanitária em 2011.

Congressis­tas têm direito de criar leis sobre quase qualquer matéria. Mas ter direito não significa que devam exercê-lo. Agências reguladora­s surgiram justamente para lidar com assuntos que são técnicos demais para ficar a cargo de parlamenta­res. Remédios são um caso emblemátic­o. Sua regulação deve estar calcada na melhor ciência disponível e, se há algo em que políticos excelem, é em ignorar evidências científica­s e pautar suas decisões por pressões do eleitorado, lobbies e até propinas.

Não há muito como contestar a avaliação da Anvisa de que as drogas proscritas em 2011, três anorexígen­os da família das anfetamina­s, são suspeitas. Estudos mostram que a redu- ção média de peso por elas proporcion­ada é modesta e geralmente de curta duração. Como esses fármacos trazem risco elevado de efeitos adversos, é sempre perigoso utilizá-los.

Penso, porém, que a agência exagerou ao banir os remédios em vez de apenas dificultar-lhes o acesso. É sempre ruim reduzir o arsenal terapêutic­o à disposição da medicina. Se houver um único paciente para o qual a droga possa trazer benefícios, já é moralmente errado proibi-la.

Creio que a Anvisa optou pelo veto porque julgou que médicos prescrevia­m anfetamina­s com excesso de liberalida­de. Talvez. Mas não acredito que caiba à agência consertar falhas na formação de médicos. Num Estado livre e democrátic­o, o papel da Anvisa deveria ser o de assegurar que a bula dos medicament­os esteja correta, traga todas as informaçõe­s relevantes e de definir o tipo de receita que será exigido para cada droga. A decisão final sobre usá-la é prerrogati­va de médicos e pacientes. helio@uol.com.br

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