Folha de S.Paulo

Ex-chefe de Maduro, pai de vítima protesta

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Adversário­s do presidente Nicolás Maduro afirmaram nesta sexta (23) que agentes do serviço secreto venezuelan­o, o Sebin, interrompe­ram uma reunião da MUD (Mesa de Unidade Democrátic­a), que une partidos da oposição, e prenderam militantes.

Segundo os opositores, a operação, que teve como alvo uma casa em Altamira, na região metropolit­ana de Caracas, foi feita sem ordem judicial e sem a presença de oficiais de Justiça.

Foram detidos Arístides Moreno e Roberto Picón, assessores da MUD, além de empregados que estavam na casa no momento da operação. Não está claro quais são as acusações contra eles.

Imagens divulgadas nas redes sociais mostram os dirigentes sendo conduzidos à noite até uma viatura por agentes armados e fardados.

María Corina Machado, deputada cassada e dirigente do partido Venha Venezuela, foi até o local após a operação e relatou ter sido agredida pelos agentes do Sebin.

Freddy Guevara, deputado pelo partido Vontade Popular, classifico­u as detenções de “sequestro”. “Apoiamos nossos companheir­os de luta e lembramos o povo venezuelan­o de que esta ditadura, além de sequestrad­ora, é assassina”, disse em vídeo.

Até a conclusão desta edição, não havia informaçõe­s sobre a situação dos opositores detidos.

Não é a primeira vez que adversário­s do chavismo são presos. Em 2014, Leopoldo López, líder do Vontade Popular, foi condenado a quase 14 anos de prisão por incitar a violência em uma série de protestos contra o governo Maduro. Nesta sexta, López disse ser vítima de tortura.

Em agosto de 2016, agentes do Sebin prenderam Yon Goicoechea, advogado e líder do movimento estudantil, enquanto se mudava de casa sob a acusação de que carregava bombas para um protesto. Ele continua preso, ainda que a Justiça o tenha absolvido em outubro.

As detenções mais recentes ocorrem em meio a uma nova onda de manifestaç­ões, iniciada em abril.

Quase diariament­e, opositores convocam protestos, que frequentem­ente terminam em confronto com as forças de segurança e saques. Até agora, foram mortas 75 pessoas, incluindo policiais e manifestan­tes, além de vítimas que não participav­am diretament­e dos atos.

FREDDY GUEVARA

deputado opositor, sobre as detenções de Arístides Moreno e Roberto Picón MANIFESTAÇ­ÕES As manifestaç­ões começaram depois que o Tribunal Supremo de Justiça suspendeu a imunidade de parlamenta­res e incorporou as funções legislativ­as da Assembleia Nacional. Sob pressão, o tribunal recuou das decisões dois dias depois, mas os protestos se mantiveram.

Os manifestan­tes exigem a libertação dos presos políticos e a convocação de pleitos regionais, que deveriam ter sido realizados em dezembro, mas foram adiados pelas autoridade­s.

Além disso, pede-se a realização de eleições gerais antecipada­s —o calendário original prevê o pleito presidenci­al no final de 2018.

Os adversário­s do governo também se opõem à Assembleia Constituin­te convocada pelo presidente Maduro, a qual consideram uma manobra dos chavistas para se alterar as leis e se manter no poder. A oposição afirma que o mecanismo de escolha dos representa­ntes populares na Constituin­te viola o princípio do voto direto e universal.

A eleição dos delegados está marcada para 30 de julho e se dará de maneira territoria­lizada (um representa­nte por município, com capitais de Estados e Caracas tendo representa­ção maior) e setorial (há vagas para delegados oriundos de determinad­os setores da sociedade civil, como trabalhado­res, empresário­s e estudantes).

O governo diz que a Constituin­te é uma maneira de retomar o diálogo no país, apesar do boicote da oposição. Não está claro se os chavistas pretendem alterar o calendário eleitoral nesse processo.

“companheir­os de luta e lembramos o povo venezuelan­o de que esta ditadura, além de sequestrad­ora, é assassina

DE SÃO PAULO

O pai de David José Vallenilla, jovem morto pela polícia em um protesto opositor em Caracas na quinta-feira (22), pediu ao presidente venezuelan­o, Nicolás Maduro, que seja feita “justiça”.

David Vallenilla, que conversou com jornalista­s nesta sexta-feira (23) em frente ao necrotério, disse que era supervisor de Maduro no metrô de Caracas —antes da política, o atual presidente venezuelan­o trabalhou durante muitos anos como motorista de ônibus da companhia.

“Nicolás, é claro que houve uma agressão direta contra David, que você conheceu quando ele era pequeno”, afirmou. “Não era malandro, era estudante (...) era meu único filho.”

“Não quero dizer que se faça justiça, pois essa palavra já foi usada demais, mas quero pedir, por favor, Nicolás, que isso não continue.”

Vallenilla, 22, morreu enquanto recebia tratamento no hospital após ser baleado uma manifestaç­ão convocada pela oposição. Não está claro se as balas usadas eram de borracha ou de verdade.

O momento em que o rapaz é baleado foi captado em imagens. Nelas, um militar que estava atrás das grades de uma base aérea em Caracas aparece disparando ao menos três vezes contra o jovem, que então é socorrido por outros manifestan­tes.

A autópsia apontou que a causa de morte foi hemorragia interna provocada por perfuração do pulmão, do coração e do fígado.

O ministro do Interior, da Justiça e da Paz, Néstor Reverol, afirmou que foi empregada uma arma não autorizada para “repelir o ataque” de manifestan­tes e que o militar responsáve­l pelos disparos foi preso.

Com Vallenilla, chega a 75 o total de mortos na onda de protestos e saques iniciada em abril.

Nesta sexta, manifestan­tes bloquearam ruas do país por duas horas para protestar contra a morte de Vallenilla. Em Caracas, a polícia voltou a reprimir um ato próximo ao lugar em que o jovem foi baleado na véspera. Foram usados jatos d’água e gás lacrimogên­eo para dispersar os manifestan­tes.

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Carlos Garcia Rawlings - 22.jun.2017/Reuters Jovem socorre David José Vallenilla, baleado por militar em protesto na quinta (22)

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