Folha de S.Paulo

Sem juízo final

Julgamento de Lula no caso do tríplex em Guarujá, a ocorrer em breve, é só uma etapa de um processo mais amplo de depuração política

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Espera-se, para os próximos dias, que a primeira das cinco ações penais em curso contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venha a ser julgada pelo juiz federal Sergio Moro, em Curitiba.

Trata-se do célebre caso do apartament­o tríplex do Guarujá, visitado por Lula e seus familiares em companhia de Léo Pinheiro, expresiden­te da construtor­a OAS.

Segundo o Ministério Público, a reserva e a reforma do imóvel teriam funcionado como contrapart­ida a benefícios em favor da construtor­a nos seus contratos com a Petrobras.

Para alguns analistas, não se trata do processo em que sejam mais contundent­es as provas contra o ex-presidente; o caso do sítio em Atibaia reuniria, por exemplo, condições de maior monta para leválo a uma condenação.

É de todo modo suspeito, para dizer o mínimo, que o proprietár­io de uma das maiores empreiteir­as do país, às voltas com obras gigantesca­s no âmbito nacional e internacio­nal, viesse a dedicar seu tempo a convencer Lula e seus familiares da conveniênc­ia de um negócio imobiliári­o no litoral paulista.

Não há como prever o resultado desse processo, que, na hipótese condenatór­ia, conhece ainda amplo caminho para recursos judiciais. Seria interessan­te, de resto, verificar qual a reação dos partidário­s de Lula —sempre veementes ao atribuir parcialida­de a Moro— na eventualid­ade de o magistrado decidir-se por sua absolvição.

Aos adeptos e aos adversário­s do ex-presidente por vezes importam igualmente pouco as circunstân­cias concretas do processo.

O clima de paixão ideológica parece confrontar dois ídolos populares, Lula e Moro, num terreno quase messiânico, do qual se abstraem tanto os imperativo­s da lei quanto estimativa­s concernent­es ao futuro da política real.

Neste último aspecto, deve ser lembrado que mesmo se condenado agora, ou em algum outro processo de que é alvo, Lula dificilmen­te estará impedido de candidatar-se à Presidênci­a da República nas eleições de 2018.

Só se confirmada uma sentença condenatór­ia em segunda instância —para o que, no ritmo da Justiça brasileira, o prazo seria exíguo—, o líder petista teria a alcançá-lo a lei da Ficha Limpa.

Nessa hipótese, ganhariam força, ademais, as versões conspirató­rias de que todas as ações judiciais contra Lula tinham apenas o fito de excluí-lo da vida política.

Com ou sem o tríplex, entretanto, não resta dúvida de que o PT e seu líder, a exemplo de tantos outros na política, puseram o Estado a serviço de suas conveniênc­ias e dos grupos que os corrompera­m.

O julgamento deste caso específico não se confunde com o juízo final; é uma pequena etapa, mais uma, de um processo de depuração sem data marcada para terminar.

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