Folha de S.Paulo

Concurso verifica cor da pele de cotistas aprovados

Candidatos a vaga de professor municipal de SP foram desclassif­icados

- PAULO SALDAÑA

Secretaria de Direitos Humanos afirma que prefeitura cumpriu decreto de Haddad (PT), que deverá ser revisto

No início de junho, Moacir Marques Lima Junior, 43, teve de entrar em uma sala com outros oito aprovados por cotas no concurso para professor da rede municipal de São Paulo. Portando uma placa com seus nomes no peito, os integrante­s do grupo foram analisados por uma comissão que, com base na aparência, definiu quem ali era ou não era negro.

“Fomos constrangi­dos e humilhados. Não estava previsto no edital do concurso que iríamos passar por um tribunal de raças”, diz Lima Junior. De cor parda, filho de mãe negra e pai branco, o professor foi eliminado da relação de aprovados por cotas.

“Minha identidade como negro foi aviltada naquele momento”, afirma.

Lima Junior passou no concurso como cotista de acordo com lei de 2013, que reserva 20% das vagas em concursos públicos para pretos, pardos e indígenas. Denominam-se como negras as pessoas com pele preta e parda.

Sem que houvesse previsão no edital do concurso, no entanto —como ressaltam Lima Junior e outros prejudicad­os—, os aprovados pelo sistema foram chamados para a sessão de verificaçã­o do fenótipo. Uma comissão da prefeitura formada por três pessoas definiu os aprovados.

Ao todo, 138 candidatos acabaram desclassif­icados na análise de aparência. A gestão João Doria (PSDB) informou que seguiu definição de decreto de 21 de dezembro de 2016, editado pelo exprefeito Fernando Haddad (PT). A equipe de Doria promete rever o decreto.

A lei municipal de cotas em concursos fala apenas em autodeclar­ação, a exemplo da legislação que reserva vagas nas universida­de federais. O decreto de Haddad, porém, incluiu este novo rito. Ele segue o que prevê, inclusive, um decreto federal editado pelo presidente Michel Temer (PMDB) para concursos federais.

Lima Junior é professor há 14 anos. Formado pela USP, ele já havia sido aprovado em outro concurso municipal pelas cotas, quando foram exigidas como comprovaçã­o fotos suas e de familiares.

Um grupo de docentes reprovados nessa etapa tem se organizado para tentar a revisão da análise. Além de não concordare­m com o método, reclamam que não houve oportunida­de de recurso.

A comissão de análise é tocada pela Secretaria de Direitos Humanos. Segundo a titular da pasta, Eloisa Arruda, o município vai conceder prazos de recurso. “A prefeitura só cumpriu o que previa o decreto, editado na gestão passada. Vamos recepciona­r as críticas, aprimorar eventualme­nte o processo ou mesmo eliminá-lo”, disse.

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