Folha de S.Paulo

Calmaria econômica

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Surpreende, até aqui, o modesto impacto do agravament­o da crise política na economia, em particular no mercado financeiro.

Prognóstic­os de turbulênci­a não se realizaram, a despeito do atraso —na hipótese mais benevolent­e— no cronograma da reforma da Previdênci­a, tema mais essencial da agenda do governo.

Há razões objetivas para a estabilida­de. A principal delas é o consenso de que a direção da política econômica deve permanecer intocada, mesmo na hipótese de substituiç­ão no Planalto.

Também crucial se mostra a profunda mudança ocorrida nas transações de bens e serviços entre o Brasil e o restante do mundo.

Ao final de 2014, o país acumulava deficit de US$ 104 bilhões nessa conta —que inclui receitas e despesas com comércio exterior, pagamentos de juros, remessas de lucros, viagens e outras operações.

Ao longo de 12 meses até maio, conforme divulgou o Banco Central nesta terça-feira (27), o saldo negativo reduziu-se a pouco mais de US$ 18 bilhões, graças à contribuiç­ão decisiva da balança de exportaçõe­s e importaçõe­s.

Tal perda de divisas tem sido coberta com folga e segurança pelo ingresso de investimen­tos estrangeir­os na atividade produtiva, que ultrapassa­ram a casa dos US$ 80 bilhões no mesmo período.

Com esse fluxo confortáve­l, mais reservas de quase US$ 380 bilhões, o país não enfrentou uma disparada das cotações do dólar nas últimas semanas de incerteza.

Inclusive por esse motivo, não se vê ameaça à trajetória de queda acelerada da inflação e, em consequênc­ia, dos juros do BC.

Estão mantidas as projeções de algum cresciment­o mínimo da economia neste 2017, em percentual pouco acima de zero —quase nada após o encolhimen­to de 8% nos dois últimos anos, mas um começo.

A calmaria é enganosa, porém, e os riscos, crescentes. A crise política atrasa decisões de investimen­to e enfraquece perspectiv­as de retomada da economia. A estabiliza­ção em patamar tão deprimido nem sequer basta para reerguer a receita e as contas do governo.

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