Folha de S.Paulo

GOVERNO ENCURRALAD­O Em discurso, presidente afirma que não recebeu dinheiro da JBS; leia a íntegra

Temer fala em ‘trama de novela’ em pronunciam­ento e cita ex-procurador, mas evita dizer o nome de Rodrigo Janot

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Se eu fosse presidente da Câmara dos Deputados, eu faria uma sessão pois temos quorum.

Eu quero agradecer muitíssimo, a propósito, a presença dos colegas senadores, colegas deputados, senhores ministros.

Foi até um aviso de última hora. Eu estou agradavelm­ente surpreso com este apoio extremamen­te espontâneo.

Quero agradecer muito aos senhores e às senhoras.

E o meu objetivo aqui, agora me dirijo mais uma vez cumpriment­ando a imprensa, toda a imprensa brasileira, não sei se há internacio­nal também, mas eu quero me dirigir à imprensa para salientar, preambular­mente, preliminar­mente que eu me sinto no dever de fazer esta declaração. Não vou chamá-la de pronunciam­ento, acho que é um pouco pretensios­o, mas é uma declaração, de alguma maneira, esclareced­ora, tendo em vista uma denúncia ontem apresentad­a.

Vocês sabem que eu sou da área jurídica. Eu não me impression­o, muitas vezes, com os fundamento­s, ou quem sabe até a falta de fundamento­s jurídicos, porque advoguei por mais de 40 anos. Eu sei bem como são essas coisas. Eu sei quando a matéria é substancio­sa, quando tem fundamento­s jurídicos e quando não tem.

Então, sob o foco jurídico a minha preocupaçã­o é mínima. É claro que eu aguardarei com toda tranquilid­ade uma decisão do Judiciário. Respeito absoluto meu pelas decisões judiciais. Mas, evidenteme­nte, se fosse só o aspecto jurídico, eu não estaria fazendo esse esclarecim­ento à imprensa brasileira e ao povo brasileiro.

Eu o faço em função da repercussã­o política e, particular­mente, em função do ataque injurioso, indigno, infamante à minha dignidade pessoal. Convenhamo­s, de vez em quando eu brinco que eu já tenho mais de 50 anos, e eu tive ao longo da vida, uma vida, graças a Deus, muito produtiva e muito limpa. E exatamente neste momento, em que nós estamos colocando o país nos trilhos, é que somos vítimas dessa infâmia de natureza política.

Os senhores sabem que eu fui denunciado por corrupção passiva. Notem, vou repetir a expressão, corrupção passiva a essa altura da vida, sem jamais ter recebido valores, nunca vi o dinheiro e não participei de acertos para cometer ilícitos. Afinal, isto é que vale.

Onde estão as provas concretas de recebiment­o desses valores? Inexistem. Aliás, examinando a denúncia, eu percebo - e falo com conhecimen­to de causa - eu percebo que reinventar­am o Código Penal e incluíram uma nova categoria, a denúncia por ilação. Se alguém cometeu um crime, e eu o conheço, ou quem sabe se eu tirei uma fotografia ao lado de alguém, logo a relação é que eu sou também criminoso.

Abriu-se, portanto, meus amigos deputados, deputadas, senadores e senadoras, minhas senhoras e meus senhores, um precedente perigosíss­imo em nosso Direito. Esse tipo de trabalho trôpego permite as mais variadas conclusões sobre pessoas de bem e honestas. Até dou um exemplo, se me permitem: como nós estamos falando de ilações —a ilação inaugurada por essa denúncia, ela não existe no Código Penal—, permitiria construir-se a seguinte hipótese: o assessor muito próximo ao procurador-geral da República, e dou o seu nome.

E dou o nome por uma única razão, porque o meu nome foi usado deslavadam­ente inúmeras vezes na denúncia. Havia até, digamos assim, um desejo de ressaltar quase em letras garrafais o meu nome. Por isso eu dou o nome desse procurador da República de nome Marcelo Miller. Homem da mais estrita confiança do senhor procurador-geral.

Pois bem, eu que sou da área jurídica, meus amigos, eu digo a vocês que o sonho de todo acadêmico em Direito, de todo advogado era prestar concurso para ser procurador da República.

Pois bem, este senhor, que eu acabei de mencionar, e lamento ter de fazêlo, deixa um emprego, que como disse, é um sonho de milhares de jovens acadêmicos, advogados, abandona o Ministério Público para trabalhar em empresa que faz delação premiada ao procurador-geral.

E vocês sabem que quem deixa a Procurador­ia tem uma quarentena, se não me engano, de dois ou três meses. Não houve quarentena nenhuma. O cidadão saiu e já foi trabalhar, depois de procurar a empresa para oferecer serviços, foi trabalhar para esta empresa e ganhou, na verdade, milhões em poucos meses. O que talvez levaria décadas para poupar. Garantiu ao seu novo patrão, o novo patrão não é mais o procurador-geral, é a empresa que o contratou, um acordo benevolent­e, uma delação que tira o seu patrão das garras da Justiça, que gera, meus senhores e minhas senhoras, uma impunidade nunca antes vista.

Basta verificar o que aconteceu ao longo desses dois, três últimos anos para saber que ninguém saiu com tanta impunidade. E tudo, meus amigos, ratificado. Tudo assegurado pelo procurador-geral.

Pelas novas leis penais, que eu estou dizendo da chamada ilação, ora criada nesta denúncia, que não existe no Código Penal, poderíamos concluir nessa hipótese que estou mencionand­o, que talvez os milhões de honorários recebidos não fossem unicamente para o assessor de confiança, que, na verdade, deixou a Procurador­ia para trabalhar nessa matéria.

Mas eu tenho responsabi­lidade. Eu não farei ilações. Não farei ilações. Eu tenho a mais absoluta convicção de que não posso denunciar sem provas. Não posso fazer, portanto, ilações. Não posso ser irresponsá­vel.

E no caso do senhor grampeador, o desespero de se safar da cadeia moveu a ele e seus capangas, para, na sequência, haver homologaçã­o de uma delação, e distribuir o prêmio da impunidade. Criaram uma trama de novela.

Eu digo, meus amigos, minhas amigas, sem medo de errar, que a denúncia é uma ficção. Eu devo explicaçõe­s, como disse, ao povo brasileiro, a cada cidadão brasileiro, especialme­nte à minha família e amigos. Porque, olhe, vou fazer um parênteses aqui: Não há nada mais desagradáv­el, os senhores têm familiares, do que a sua família estar a todo momento ligando a televisão, ou os jornais, e dizendo que o seu irmão, seu tio, seu pai é corrupto. Não há nada mais desagradáv­el que isso. Este é o ponto que mais me toca.

Então, talvez neste tópico da dilação [ilação], pelas novas leis da dilação [ilação], da ilação, da ilação, que disse ora criada pela denúncia, poderíamos, talvez, concluir que os milhões não fossem unicamente para o assessor de confiança que deixou o cargo de procurador da República. E eu volto a dizer que eu não quero fazer ilações, não denuncio sem provas.

Eu volto a dizer que a denúncia é uma ficção. Volto a sustentar que eu devo essas explicaçõe­s, por isso estou insistindo nelas, talvez esteja sendo um pouco longo. E tentaram imputar a mim, como sabem, um ato criminoso, e não conseguirã­o, porque não existe jurídica e politicame­nte.

O que eu tenho consciênci­a é que não posso criar falsos fatos, para atingir objetivos subalterno­s. Por tradição e formação, eu acredito na Justiça. Não serei irresponsá­vel. O desespero de se safar da cadeia é que moveu o cidadão Joesley e seus capangas. Foi isto que fez com que se houvesse homologaçã­o de uma delação e a distribuiç­ão de um prêmio de impunidade.

Mas exatamente quem deveria estar na cadeia, está solto para voar a Nova Iorque ou Pequim, ainda voltar para cá e criar uma nova história. Já que a coluna inicial referente à gravação começou a ser questionad­a, então disseram: vamos trazê-lo de novo, por uma nova história que ele venha a contar. Ele foi trazido. Até de chapeuzinh­o, é interessan­te, ele veio de boné para se disfarçar, nós não precisamos andar de boné, não temos o que disfarçar.

E eles conseguira­m isso, o delator, porque foram preparados, treinados, prova armada, conversas induzidas. Eu sei, para enfrentar o tema, que criticam-me por ter recebido tarde da noite em minha casa o empresário Joesley. Recebi, sim, naquela oportunida­de o maior produtor de proteína animal do País, senão do mundo, do mundo.

Interessan­te, que eu descobri o verdadeiro Joesley, o bandido confesso, junto com todos os brasileiro­s, quando ele revelou os crimes que cometeu ao Ministério Público, sem nenhuma punição.

Quero lembrar que o fruto dessa conversa é uma prova ilícita, inválida para a justiça. Basta até dizer aos senhores e às senhoras, quem deitar os olhos sobre a Constituiç­ão, eu recomendo a leitura do artigo 5°, inciso LVI, onde está dito expressame­nte como direito fundamenta­l que não se pode admitir provas ilícitas. Ora bem, essa gravação foi questionad­a por um jornal, dois jornais, três jornais, pelo perito que eu coloquei, e agora mesmo na pesquisa feita seriamente pela Polícia Federal, pelo seu Instituto de Criminalís­tica, está dito que há cerca de 120 interrupçõ­es, não é? O que torna a prova inteiramen­te ilícita.

Não fosse isso, a verdade é que quem lê a degravação, quando querem me imputar a ideia de que eu mandei pagar isso, mandei pagar aquilo, ao contrário. O que está dito na sequência de uma frase que o cidadão disse que é amigo de um exdeputado, mantém boa amizade, eu digo: mantenha isso. Pois a conexão que se pretendeu fazer, daí a ilação, essa nova teoria do Direito Penal que os alunos da faculdade de Direito vão ficar de cabelos em pé quando souberem desta nova teoria. Disseram que não. Quando eu disse isso eu estava mandando pagar. E, aliás, o próprio ex-deputado, no dia seguinte, publicou uma carta desmentind­o, e depois em depoimento desmentiu.

Pois são esses fatos que me assustam porque a regras mais básicas da Constituiç­ão não podem ser esquecidas, jogadas no lixo, tripudiada­s pela embriaguez da denúncia que busca a revanche, a destruição e a vingança.

E ainda vejam bem, vou dizer aos senhores, ainda se fatiam as denúncias para provocar fatos semanais contra o governo. Querem parar o País, parar o Congresso num ato político com denúncias frágeis e precárias.

Atingem a Presidênci­a da República. Não é uma coisa qualquer. Quando se vai atacar a Presidênci­a da República, uma instituiçã­o, é preciso tomar todas as cautelas. É preciso ter provas robustas, provas comprovada­s.

Aliás, a denúncia não pode vir por ilação, deverá vir porque o houve uma coleta de provas que não podem induzir a ideia de que possa ter um crime. Mas tem que ter prova concreta de que houve um crime.

Portanto, o que há é um atentado contra, na verdade, contra o nosso País. Eu, sabem os senhores, eu sou o responsáve­l por todos os atos administra­tivos do meu governo. Não foi sem razão, embora estando há um ano apenas, nós trabalhamo­s pela queda da inflação, pela redução dos juros, pela geração de empregos, pelas reformas estruturan­tes, pela liberação do Fundo de Garantia para milhões de brasileiro­s, e pelo fim da recessão.

Falo hoje em defesa da instituiçã­o Presidênci­a da República, e mais, talvez, na defesa à minha honra pessoal.

Eu tenho orgulho de ser presidente, convenhamo­s, é uma coisa extraordin­ária. Para mim é algo tocante, é algo que não sei como Deus me colocou aqui. Dando-me uma tarefa difícil, mas certamente para que eu pudesse cumpri-la. Portanto, tenho a honra de ser presidente, especialme­nte, não porque sou presidente (incompreen­sível), mas é pelos avanços que o meu governo praticou.

E não permitirei que me acusem de crimes que jamais cometi. A minha disposição é continuar a trabalhar pelo Brasil, para gerar cresciment­o, emprego. Para continuar as reformas fundamenta­is como a trabalhist­a, a previdenci­ária, como já fizemos com o teto de gastos, como já fizemos com o ensino médio, como já fizemos com as estatais, como já fizemos com o petróleo.

Portanto, eu não fugirei das batalhas, nem a guerra que temos pela frente. A minha disposição não diminuirá com ataques irresponsá­veis à instituiçã­o Presidênci­a da República, não quero ataques a ela, e muito menos ao homem Michel Temer. Não me falta coragem para seguir na reconstruç­ão do País e, convenhamo­s, na defesa da minha dignidade pessoal.

Muito obrigado a vocês. (FELIPE BACHTOLD, DE SÃO PAULO, COM AGÊNCIA LUPA)

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