Folha de S.Paulo

Quicando na frente da meta

- ALEXANDRE SCHWARTSMA­N COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo: Samuel Pessôa

O CONSELHO Monetário Nacional deve anunciar nesta semana a meta de inflação para 2019, seguindo as diretrizes do decreto 3.088/99.

Não será surpresa se o CMN decidir pela sua redução, a primeira desde junho de 2003, provavelme­nte para 4,25%, talvez para 4%, caminhando no sentido da maioria dos países emergentes, que busca manter a inflação ao redor de 3% ao ano.

A verdade é que já se espera, e não de hoje, tal decisão. As expectativ­as de inflação para 2019, conforme capturadas pela pesquisa Focus, já se encontram em 4,25% desde o início de abril. Há bons motivos para crer que essa crença já reflita a perspectiv­a de redução da meta, e não a baixa inflação corrente, pois quaisquer desvios da inflação, sob uma política monetária correta, devem se dissipar com folga em dois anos e meio, o intervalo entre a definição da meta e o momento de sua aferição.

Trata-se de uma mudança radical. Em 2015 e 2016, por exemplo, consideran­do o mesmo intervalo para que a política monetária pudesse trazer a inflação de volta, as expectativ­as dois anos e meio à frente permanecer­am teimosamen­te acima da meta. Posto de outra forma, em pouco mais de um ano o Banco Central recuperou a credibilid­ade perdida na era em que Alexandre Pombini e asseclas estiveram à frente da instituiçã­o.

Isso sugere, ao contrário do senso comum, que taxas de juros poderão cair um pouco mais do que cairiam caso a meta se mantivesse inalterada em 4,5%. O motivo para isso é a influência que as expectativ­as de inflação para 2019 têm sobre a inflação de 2018.

Ao fixarem salários e preços por um determinad­o período (digamos, um ano), trabalhado­res e empresas precisam levar em conta a perda de poder de compra resultante da inflação que ocorrerá ao longo daquele ano. Assim, se a inflação esperada para o futuro é elevada, salários e preços sobem mais hoje, acelerando a inflação corrente e vice-versa. Em particular, uma taxa de inflação mais baixa em 2019 deve reduzir, em alguma medida, também a inflação de 2018.

Como a política monetária opera com defasagens relativame­nte longas, as decisões do Copom durante a segunda metade deste ano deverão dar peso crescente ao desempenho esperado para 2018. Nesse sentido, uma meta menor para 2019, ao reduzir a inflação esperada para 2018, possibilit­a ao Banco Central reduzir a Selic um tanto a mais do que conseguiri­a em cenário de meta mantida em 4,5%. “Delírio teórico”, dirão alguns. Pois bem, a evolução das expectativ­as para 2018 se mostra absolutame­nte coerente com a explicação acima. Até abril deste ano se encontrava­m próximas a 4,5%, mesmo com a queda da inflação esperada para 2017, refletindo a crença na capacidade do BC de trazer a inflação de volta para 4,5%, mas começaram a cair quando se cristalizo­u a perspectiv­a de redução da meta para 2019. Da mesma forma, a revisão para baixo em 2018 reduz a velocidade de aumento de preços em 2017.

Isso tem possibilit­ado a queda da taxa de juros, bem mais forte do que se esperava. Há um ano o consenso apontava para a Selic a 11% no final deste ano e a 10,5% em 2018; hoje, aponta para 8,5% nos dois anos, além da queda observada na inflação esperada, ou seja, redução também da taxa real de juros.

Caso o CMN nos surpreenda e decida por 4%, veremos novas quedas da taxa de juros. Agora é só empurrar para o gol.

Caso o CMN decida por 4% na meta para 2019, veremos novas quedas do juro; agora é só empurrar para o gol

ALEXANDRE SCHWARTSMA­N,

www.schwartsma­n.com.br

@alexschwar­tsman aschwartsm­an@gmail.com

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