Provas fortes e convergentes
Pela primeira vez na história do Brasil, um presidente da República foi denunciado por crime de corrupção passiva cometido no exercício do mandato. A peça acusatória, tecnicamente conhecida como denúncia, foi alvo de severas críticas por parte do denunciado.
Uma das táticas empregadas pelos investigados é a de tentar desqualificar o acusador —no caso, o procurador-geral da República—, dizendo, entre outras coisas graves, que a peça acusatória se trata de uma ficção.
Não nos parece que a denúncia narre uma ficção, mas sim uma triste história que tem se repetido por anos em nosso país —e que não se sabe quando acabará.
A denúncia descreve em detalhe toda a dinâmica dos fatos, desde o encontro dissimulado de Joesley Mendonça Batista com o presidente Michel Temer (fora do horário de expediente e da agenda oficial) até o recebimento da mala com o dinheiro pelo então deputado federal Rodrigo Loures (PMDB-PR).
A argumentação apresentada na peça acusatória, baseada em vasto conjunto probatório angariado em ação controlada judicialmente autorizada, nos leva à necessária conclusão de que Rodrigo Loures recebeu o dinheiro a mando do presidente Michel Temer. A quantia se- ria parte de um pagamento maior, que poderia chegar ao patamar de R$ 38 milhões ao longo de aproximadamente nove meses.
A velha ladainha de que não existem provas começou novamente a ecoar. Podem efetivamente não haver provas concretas contra o presidente da República, uma vez que não foi ele a figura flagrada com a mala de dinheiro.
Mas a prova indiciária é forte e converge sempre na direção do presidente como destinatário daquele montante, ao menos em parte.
Costuma-se dizer que os indícios não são prova, pois baseados em probabilidades, e não em certeza. Não é verdade. Os indícios estão previstos no ordenamento processual penal objetivo, no capítulo que trata justamente das provas.
Não há hierarquia entre as diversas espécies de prova. Não é sua natureza (prova direta ou indireta) que vai influir na convicção do magistrado. É a qualidade da prova, que poderá ou não convencer o juiz acerca da reconstrução histórica dos fatos, que é o seu objeto.
Indícios são fatos secundários, conhecidos e provados, relacionados ao principal e que autorizem chegarse a uma conclusão sobre algo a partir de deduções ou inferências.
Isoladamente, em regra, o indício não é uma prova plena. Mas vá- rios indícios apontando sempre em uma mesma direção podem demonstrar a ocorrência de um fato ou circunstância.
A denúncia oferecida pelo procurador-geral da República reconstrói os fatos com amparo em indícios fortes e convergentes —os quais, se não forem desconstruídos durante a instrução processual, levam necessariamente à conclusão de que o presidente da República cometeu crime de corrupção passiva no exercício de seu mandato.
A denúncia é apenas a peça inicial da ação penal e vem instruída com as provas recolhidas até o momento. Durante a instrução processual, as partes poderão produzir outras provas sob o crivo do contraditório.
Para que se receba a denúncia e tenha início a ação penal, bastam indícios suficientes de autoria e prova da existência do crime, enquanto para a condenação as provas devem ser firmes e coerentes, afastada qualquer dúvida razoável.
Se nada for alterado e os fatos que constam da denúncia (embasada em prova indiciária forte e convergente) se confirmarem, a procedência da ação penal será de rigor. CÉSAR DARIO MARIANO DA SILVA,
Pelo ronco da cuíca, suspeito que ao cabo não restará ninguém da bandidagem preso. E, em surrealista paralelo com “O alienista”, de Machado de Assis, receio que quem desmantelou o Brasil ainda vai industriar expediente para transformar o grande Moro num Simão Bacamarte redivivo e confiná-lo em Pinhais, como único produto final da Lava Jato (“Fachin decide libertar Rocha Loures, ex-assessor de Temer”, folha.com/no1897447). É isso.
JOAQUIM QUINTINO FILHO
Governo encurralado Defender a permanência de Temer, como querem empresários e parte da grande mídia, é compactuar com a indecência. Temos de ter a coragem de ir até o fim. Só assim purificaremos a nação (“Leitura tem ‘interpretação dramática’ em plenário vazio”, “Poder”, 30/6).
ADEMAR G. FEITEIRO,
Fosse por estratégia ou até por constrangimento, os golpistas de antigamente agiam nos porões, na calada da noite. Atualmente, a desfaçatez é tamanha que dão de ombros a qualquer escrúpulo, agindo na nebulosidade dos dias em que vivemos.
ANTONIO F. DA SILVA,
Os advogados de Lula fazem a defesa de seu cliente imaginando que estão se dirigindo à militância do PT, que aceita tudo o que lhe imputam. O nível de informação dos leitores da Folha é um “pouquinho” diferenciado do desses ideólogos contumazes. A Caixa já informou que as debêntures adquiridas da OAS Empreendimentos, em 2009, nada têm a ver com o fundo FI-FGTS, o que não impedia a venda do apartamento (Painel do Leitor, 30/6).
ANTONIO A. DE CASTRO OLIVEIRA
Um mundo de muros O leitor Paulo Boccato (Painel do Leitor, 30/6) compara a Muralha da China e a Muralha de Adriano aos muros do “malvadão” (sic) Trump, dizendo que aqueles protegiam a população dos bárbaros. Os romanos massacravam até os cães das cidades que lhes ofereciam resistência e os americanos explodem com seus drones quem eles querem pelo mundo. Seriam realmente os escoceses e os “chicanos” (incluindo aí os brasileiros) os bárbaros?