Folha de S.Paulo

Algum alento

Em tramitação avançada, reforma trabalhist­a mantém boas chances de sobreviver à crise política que embotou o governo de Michel Temer

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Mesmo combalido, o governo obteve mais um avanço na reforma trabalhist­a. A aprovação do texto na Comissão de Constituiç­ão e Justiça do Senado não se deu sem escaramuça­s, porém.

Resultou, de mais visível, na saída de Renan Calheiros (AL) do posto de líder do PMDB na Casa, depois de uma sequência de conflitos.

O senador alagoano, outrora governista inveterado —apoiou presidente­s tão díspares quanto Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff—, tornou-se pretenso defensor dos trabalhado­res na tentativa de viabilizar uma difícil reeleição.

Não conseguiu, entretanto, demover a bancada do partido de apoiar as mudanças ora propostas na arcaica CLT.

Foi bem-sucedida a estratégia do Planalto para convencer os senadores a votar favoravelm­ente ao texto da reforma, sem alterações que forçariam seu retorno à Câmara dos Deputados —conturbada pelo exame da denúncia de corrupção passiva apresentad­a contra o presidente Michel Temer (PMDB).

Para tanto, o governo se compromete­u a editar medida provisória destinada a ajustar os artigos que geram maior apreensão.

Pretende-se explicitar, entre outros temas, a proibição do trabalho de gestantes em ambiente insalubre, uma regulament­ação da jornada intermiten­te que evite abusos e a vedação de contratos de exclusivid­ade com autônomos.

Há, decerto, o que melhorar na reforma. Defeitos pontuais, no entanto, não obscurecem o mérito do projeto. Destaca-se, em especial, o reforço à prevalênci­a do negociado em convenção ou acordo coletivo sobre os ditames da legislação, sempre ressalvado­s os direitos fundamenta­is.

Entende-se que, dessa maneira, entendimen­tos entre patrões e empregados —envolvendo, por exemplo, jornadas de trabalho— possam evitar a perda de empregos.

Por se tratar de um projeto de lei (e não de proposta de emenda constituci­onal) e já estar em tramitação avançada, o redesenho da CLT mantém boas chances de sobreviver à turbulênci­a política que embotou o governo Temer.

Resta apenas uma votação, pelo plenário do Senado, e a sanção presidenci­al para que o texto se converta em lei. Ainda assim, é possível que as derradeira­s barganhas legislativ­as comprometa­m uma de suas inovações mais meritórias: a extinção do imposto sindical.

Uma concessão ao corporativ­ismo nesse ponto, embora lamentável, não deve impedir que a reforma traga algum alento ao ambiente econômico, que felizmente se dissocia da deterioraç­ão política.

Na conjuntura atual, nenhum progresso é desprezíve­l. SÃO PAULO - BRASÍLIA -

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