CRÍTICA Biografia não autorizada tenta decifrar a personalidade de Marcelo Odebrecht
‘O Príncipe’, que será lançado nesta semana, aborda desavença familiar e filosofia corporativa
“O Príncipe”, livro anunciado como uma biografia não autorizada de Marcelo Odebrecht, tenta elucidar o paradoxo do empresário, talvez o mais importante preso da Operação Lava Jato.
Ao mesmo tempo em que é tido como fechado e de difícil relacionamento, ele aprofundou os elos do grupo com políticos, formando um gigantesco esquema de pagamento de propina, que se espalhou por uma série de países e que hoje ameaça presidentes.
Escrita pelos jornalistas Marcelo Cabral e Regiane Oliveira, ambos com trajetória no jornalismo econômico, a obra tenta desvendar a personalidade do herdeiro da empreiteira, descrito como um “anti-Eike Batista”, o ex-bilionário conhecido pelo gosto pelos holofotes —que por sinal também foi preso em um braço da Lava Jato, neste ano.
Ex-recruta do Exército, engenheiro recém-formado que foi trabalhar no interior do país para ganhar experiência, Marcelo, hoje com 48 anos, é descrito como seguidor do estilo disciplinado do avô Norberto, fundador do grupo.
A desavença com o pai, Emílio, com quem rompeu em meio à pressão para que aceitasse o acordo de delação, é uma das principais marcas no perfil escrito pela dupla.
Ao assumir o comando do grupo, em 2008, Marcelo saboreou o auge da empresa, multiplicou o faturamento e defendeu sua expansão, ampliando o foco para áreas como combustíveis e agroindústria. Na mesma toada, segundo os autores, decidiu dar “profissionalismo empresarial” ao suborno político.
Convocou para a tarefa um auxiliar de confiança, que projetou o Setor de Operações Estruturadas, e estabeleceu que os repasses seriam descentralizados —o que elevou também a quantidade de dinheiro gasto com esse fim.
Foi o mais ousado passo para um herdeiro forjado sob os princípios da TEO (Tecnologia Empresarial Odebrecht), um manual da filosofia corporativa concebido por Norberto que mistura orientações sobre crescimento pessoal a conceitos inspirados em Martinho Lutero ou no filósofo Jean-Jacques Rousseau. O FUTURO A ambição de ser uma completa “biografia não autorizada”, como diz a capa do livro, porém, não chega a ser alcançada. Longos trechos são dedicados a contextualizar e rememorar a Lava Jato e seus episódios mais marcantes.
O relato sobre a investigação e o cerco à empresa, que resultou no mega-acordo de colaboração, somente compila o que saiu na imprensa no período. As intrincadas idas e vindas da operação, ao longo de três anos, acabam narradas com alguns tropeços.
Um capítulo reproduz depoimentos da delação de Marcelo, formando um relato em primeira pessoa sobre a arquitetura do esquema. Também são citados detalhes de seu período na prisão, como um pedido para que subordinados detidos usassem camisas com o logotipo da empresa.
O ritmo da obra, que não segue ordem cronológica, volta a crescer no fim, ao analisar a incerteza sobre o futuro da empreiteira, que teve a imagem estraçalhada, perdeu dezenas de executivos no acordo de delação e, “pela primeira vez na história”, não tem um Odebrecht no comando.